6 de março de 2006

Quando se morre

ExampleHenrique Teixeira de Sousa esteve em Novembro do ano passado, nestas ilhas, onde lançou, dir-se-ia que a titulo de despedida, o seu último romance Oh mar de Túrbidas Vagas. Uma homenagem expressa ao poeta bravense, Eugénio Tavares, e às viagens longínquas do cabo-verdiano à descoberta da América, de que também foi personagem. Era originário da minha ilha e autor do primeiro livro de contos que li na minha vida. Conheci-o era eu uma adolescente, em S. Jorge, na praia das Salinas, que ele chamava de piscina natural do Fogo. Gostava do meu nome, o mesmo de sua mãe e filha, dissera-me então.

Teixeira de Sousa deixa um legado incontornável na literatura cabo-verdiana através dos seus oito romances: sendo os mais populares Contra mar e vento, Capitão de mar e terra, e Ilhéu de Contenda, este último adaptado ao cinema.

A sua trajectória confunde-se com a dinâmica histórica e sociológica destas ilhas. Nasceu na ilha do Fogo em 1919, e dividiu a sua adolescência entre a Cidade de S. Filipe, e a zona de S. Jorge, norte da ilha, onde a sua família tinha terras. Fez os estudos liceais em S.Vicente, e seguiu para Lisboa onde cursou em medicina em 1945.

De regresso a Cabo Verde, enquanto escritor, Teixeira de Sousa, muito influenciado pela geração dos claridosos, retratou estas ilhas com olhar crítico e sentido de pertença, tendo deixado para a posteridade um dos mais emblemáticos testemunhos literários da evolução sociológica deste povo. Enquanto médico, sempre esteve próximo dos mais necessitados. Chegou mesmo a exercer o cargo de presidente da Câmara de S.Vicente, onde deixou marcas indeléveis.

Henrique Teixeira de Sousa, morreu atropelado, na semana passada, em Portugal, onde residia há 30 anos, e não pôde cumprir duas promessas: publicar o livro S. Jorge, cujo enredo histórico se passaria na ilha do Fogo e seria uma homenagem ao seu avô, e escrever uma obra lírica sob o título Na Madrugada dos teus olhos.

Em décadas de feitos por estas ilhas, são estas as únicas promessas de Teixeira de Sousa deixadas por cumprir.

7 comentários:

H. Sousa disse...

O post faz uma descrição fidedigna, com uma ligeira imprecisão. Se ele disse que gostava do seu nome porque era igual ao da mãe e de uma filha talvez ele se tenha enganado ou confundido filha com neta. Uma neta dele é que tem o nome da mãe dele.
Obrigado!

pura eu disse...

H.Sousa pode ser que ele tenha mesmo dito filha e neta... o engano pode ser meu. Já lá vão alguns anos. Obrigada pelo comentário.

Foi, sim, uma morte estúpida Objectivo. Muito triste.

H. Sousa disse...

Não, como já publicitaste o teu nome, Margarida, a filha, que é única porque os outros seis são todos rapazes, chama-se também Margarida e tem o "nominha" de Guiducha. Mas a mãe chamava-se Laura, assim como uma neta.

pura eu disse...

h.sousa já que descobriste! É sim, Margarida esse nome tão repartido nessa nossa conversa de anos... não me lembro, ao certo, quem confundiu os nomeados, só consigo ter a certeza de que eram três. Mas se, de facto, existe uma mãe e uma neta com o mesmo nome, a confusão dos nomeados deveu-se, certamente, ao falecido. Um enigma, dificil de se decifrar neste momento :)

Anónimo disse...

De uma coisa, todos podemos ter a certeza: 'dentro' ou 'fora' das letras, Teixeira de Sousa sempre foi um herói. Pelo menos, o espérito e a obra dele procura transmitir-nos essa certeza.
Continua a ser aquele mágico autor que 'conheci' com doze anos quando me encontrei defronte com ele no mundo em que se rema "Contra Mar e Vento". É um autor que chega à alma.

H. Sousa disse...

Volto só para dizer que Henrique Teixeira de Sousa era meu pai (sou um dos sete filhos) e fui o único (creio) que não foi ao funeral porque não alinho em palhaçadas. O meu blog já está no ar de novo.
Abraços.

pura eu disse...

h. Sousa já estava quase que certa da sua origem. O seu blog é muito acutilante e necessário. Gostei.

Abraços