18 de julho de 2006

Em busca do "meu clássico"

Terminei de ler "Riso na Escuridão" de Vladimir Nabokov, releio "O Amante" de Marguerite Duras e inicío uma viagem por "Porque ler os clássicos?", de Ítalo Calvino. Este último livro fez-me pensar nas minhas leituras de adolescência. Leituras desajeitadas, porque não orientadas, leituras ao acaso, algumas indicadas, é certo. A minha grande decepção residia na memória nublada que tenho de alguns livros. Nos meus 13, 14 anos devorei a magra coleccão juvenil, e não só, da biblioteca municipal da minha cidade. Era conhecida do responsável pela Biblioteca, um rapaz que tomava conta apenas daquele espaço, já que mal sabia escrever. Tinha entrada e circulação livre pelas estantes, via e revia os titulos, lia e relia as introduções. Aquilo que me agradava à primeira, levava.
Revistas e jornais também contam. O pároco de S.Filipe era assinante da revista Família Cristã. Eu era a segunda leitora assídua de cada número daquela publicação. Ia à casa do Pároco, religiosamente, todas os meses, saber se tinha chegado a revista. Algumas ficavam para mim, outras não. O jornal Terra Nova era outro periódico que também fazia parte do meu mundo. Orientação, orientação, nunca tive. Pedro Cardoso e Eugénio Tavares figuravam como os únicos grandes homens de Cabo Verde. Pelo menos na região Fogo e Brava, onde todos tinham algo a dizer sobre esses homens. Acabei descobrindo os outros, assim como descobri muitos outros, de outras latitudes, outros mundos, outras raízes, e outras aldeias, iguais àquela onde nasci e cresci. Continuo nessa incessante caminhada em busca do "meu clássico", como, de resto, aconselha Calvino.

Dizia, entretanto, que ler o trecho abaixo foi reconfortante para mim, e originou este post...

"De facto as leituras da juventude podem ser poucas profícuas por impaciência, distracção, e inexperiência da instrução para o uso e inexperiência das instruções de vida. Podem ser (se calhar ao mesmo tempo) formativas no sentido de darem uma forma às experiências futuras, fornecendo modelos, conteúdos, termos de comparação, esquemas de classificação, escalas de valores, paradigmas de beleza: tudo coisas que continuam a agir mesmo que do livro lido na juventude se recorde pouquíssimo ou mesmo nada..."

in: Porque ler os Clássicos?, de Ítalo Calvino

13 comentários:

Kamia disse...

Margarida, eu também não tive quem me orientasse as leituras. Tive apenas um pouco de censura por parte da minha mãe que se preocupava em que eu não lesse coisas que não fossem para a minha idade, mas eu conseguia fintá-la e aos 13 anos devorava Jorge Amado,Eça de Queirós, Albert Camus,Teixeira de Sousa entre outros e também a deliciosa colecção Sitio do Picapau Amarelo do Monteiro Lobato, Uma Aventura, Os Sete...

Engraçado, eu também era "rato de biblioteca": subia o Plateau a pé para ir buscar resmas de livros ao ICL. a funcionária ficava espantada com a rapidez com que eu os devolvia e vaticinava que eu ia ter problemas de vista (voilá...).

Penso que os únicos clássicos que li na vida foram os Lusíadas e partes da Ilíada.Okay, preciso actualizar-me. Isso de demorar seis meses a ler O Espião Perfeito não ajuda nada...
Continua com as boas leituras e já agora, não me queres emprestar " O Amante" ? :)

pura eu disse...

Pois é, Kamia. Temos muito em comum, pelo que vejo. Mas pronto, cá vamos.
Empresto O Amante, assim que terminar uma das mais prazerosas leituras de sempre! Leio esse livro de forma cíclica, é uma necessidade... assim também vejo a adaptação para o cinema de Jean Jacques Annaud. Preciso sempre voltar a eles... acho que será sempre assim.

Bjs

Anónimo disse...

Magui, achei interessante partilhares as tuas leituras,com os visitantes do teu Blog.É inovadora tua postura, ou seja humaniza o blog, dando um quê de algo muito próximo.Valeu amiga.

Maria José Macedo

pura eu disse...

Querida, mais do que partilhar leituras, fiz confidências... aos silenciosos e cúmplices.Bjs

Anónimo disse...

Sim, fizestes confidências e eu cá sei a quem. Apaixonada?

pura eu disse...

É o terceiro comentário que me tem como apaixonada. Curioso isso! Sabes a quem fiz essas confidências? Diz lá. Usa o meu e-mail, por favor, para evitar embaraços desnecessários... a não ser que seja incómodo para ti!

Anónimo disse...

É incómodo, infelizmente. Seria até embaraçoso. Mas tentarei, se as coisas estiverem amadurecidas, por via mais directa. É a terceira vez? O amor é coisa bonita, pelos vistos.

Anónimo disse...

Margarida, como invejo quem consegue devorar os livros, mesmo com a distração dos adolescentes. Gosto de ler, mas sou muito lento. Como você, há uns três anos tomei a decisão de ler clássicos. Achei uma lista de um jornal "100 livros que você não pode morrer sem ler" e comecei de leve (o que recomendo): "Cândido" de Voltaire, "Apanhador nos Campos de Centeio" (Catcher in the Rye) de J.D. Sallinger, livros de bolso como alguns Shakespeare (li uns dez), Édipo-Rei, Dama das Camélias e um ou dois Julio Verne. Parti para Metamorfose, Dom Casmurro. Daí uns dez meses para Crime e Castigo, quase desisti. E finalmente quase dois anos para Grande Sertão: Veredas. Desde então, não consegui engatar mais nenhum clássico. Vou ver se animo ainda esse ano...
Bjs, Vladimir

pura eu disse...
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pura eu disse...

Obrigada pelas novas sugestões Erasmo.

pura eu disse...

Anima-te Vladimir, e olha que já vais longe! Quem sempre lê, convive com os clássicos de uma forma ou de outra. As referências, muitas vezes, estão lá, intactas, outras vezes digeridas (o que é ainda melhor). Avante.

De ânimo precisa também o meu outro visitante (não identificado). Parece que algo o atormenta. O incómodo e o embaraço podem ser pequenas pedras soltas de uma promissora estrada, meu caro... pode se surpreender. Se não ousar, nunca saberá, entretanto.

Anónimo disse...

O problema não é a falta de ânimo. É o de respeitar as pessoas. Sou demasiado amigo de alguém que lhe é próximo, o que dificulta as coisas. Deixar passar o tempo....

pura eu disse...

Essas confidências inocentes ganharam proporções delicadas, admito. E eu,sinceramente,nem sequer tenho ideia de quem possa ser esse visitante (não identificado). Já vi que alguma coisa me escapa, para não dizer muita.