1 de agosto de 2011

Os Dons...e o Poder



Ouvir falar de Mário Puzo - 1920 -1999, conduz invariavelmente ao Padrinho (a saga da família Corleone), romance, adaptado ao cinema pelo realizador, Francis Capola. A abordagem da máfia italiana é retomada no último livro desse americano de origem italiana, A Família. Uma obra que narra a vida da lendária família Borgia, mais centradamente do cardeal Rodrigo Bórgia (Papa Alexandre VI). Um livro fausto e perturbante sobre os primórdios da máfia na Itália. Puzo, valendo-se do seu conhecimento da Itália profunda e da história (em colaboração com o historiador Bert Fields) e de um árduo trabalho de elaboração, deixa para a posteridade “um livro fundamental”. Em plena peste negra na Europa do Séc. XIV, com a população a ser dizimada, os homens começam a perder esperança no poder celestial e depositam a sua confiança no imediatismo terreno. Pertencer à igreja católica romana não era necessariamente sinónimo de profecia de fé e temor a Deus. Era um meio de exercer o poder, para o qual, contavam todos os subornos e favores envolvendo a aristocracia e a cúpula da igreja. A família Rodrigo Bórgia marca o Renascimento. Subornos, incesto, ambição, assassínios, traição, conspiração e luxo são os meios através dos quais os reinos, o Vaticano, as Cidade-estados que hoje fazem parte da Itália e países como França e Espanha, chegaram, mantiveram o poder e estabeleceram alianças, a todo o custo.
Puzo retrata a saga de “mais uma família italiana”, através da guerra, da arte (Miguel Ângelo, Da Vinci...), da estratégia florentina do poder (Maquiavel) e da igreja, num livro único.

Segundo todas as aparências, dir-se-iam que apreciavam a companhia um do outro e um espectador não teria adivinhado o que ia no coração de cada um dos religiosos.Todavia o cardeal, sempre alerta e desconfiado dos Bórgia, recusou-se a beber o vinho, não fosse ter sido envenenado. Não obstante, vendo que o Papa comia com gosto, comeu também com fartura, pedindo apenas água fresca em lugar de vinho, pois a água era transparente e qualquer intenção menos clara não lhe passaria despercebida.Terminada o jantar, no preciso momento em que o Papa convidava o cardeal a reunir-se-lhe no escritório, o cardeal António Orsini agarrou-se ao estômago, amarfanhou-se na cadeira e caiu redondo no chão, com os olhos a rebolarem nas órbitas como os mares nos frescos das paredes dos aposentos do Papa. - Eu não bebi vinho, sussurou roucamente o cardeal
- Mas comeste os chocos com tinta – retorquiu o Papa.
Nessa mesma noite o cardeal Orsini foi levado pelos guardas papais a fim de ser sepultado. Durante uma missa na capela, no dia seguinte, o próprio Papa proferiu orações pela alma do cardeal e mandou-o para o céu com a sua benção.”

Mario Puzo faleceu antes de terminar este livro, o que acabou por ser feito pela esposa, Carol Gino. Esta escreve no posfácio que “Mário sentia fascínio pela Itália renascentista e especialmente pela família Bórgia. Garantia que eles eram a família do crime original... Estava convencido de que os Papas tinham sido os primeiros Dons, sendo o Papa Alexandre, o maior de todos eles”.

pura eu: republico um texto de 2007. é que venho fugindo de certas repetições ... e os tempos históricos pertencem-nos a todos! pertencem, sim.

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