17 de dezembro de 2009

(Ainda) a mensagem, e a obsessão do Narciso

imagem















1. A eficácia de uma campanha não se mede pela sua repetição desenfreada. Quando isso acontece, os telespectadores e/ou ouvintes começam a perder interesse na própria campanha em questão, independentemente da pertinência do conteúdo. Já é hora do staff do Ministério da Saúde mudar a publicidade que alerta sobre os sintomas da dengue, e apela à procura imediata dos centros de saúde ou hospitais em caso de contaminação. Certamente, que, com o decorrer dos acontecimentos, outros tipos de mensagem tornam-se mais actuais do que outros. É pensar nisso.

2. O jornal que chama para si o epíteto de todas as qualidades mediáticas das ilhas, não faltando a da isenção e da imparcialidade, estará a organizar no final da tarde de hoje uma mesa redonda sobre o campo mediático cabo-verdiano. Assim decidiu a publicação assinalar mais um ano de vida. Tentamos, mas não deu para ir ouvir os sermões de uma bíblia com tantos poucos seguidores por estas bandas. Com sérios e absolutos problemas de consciência vive alguma imprensa, com o agravante de tal qual Narciso, adorarem o espelho.

3. “Nunca parti deste cais”, escreveu o meu poeta …

15 de dezembro de 2009

Da imagem à mensagem

nonsense
























1. Chamaria a isso os pequenos vícios da província, e tem nome e tudo: O vaso da abertura. Certamente, lá em casa já teve a oportunidade de ver na TV as tantas aberturas oficiais de encontros, ateliers e outros, que acontecem em Cabo-Verde, presididas por membros do governo e/ou Presidente da República. Nunca faltam aqueles vasos compostos de flores artificiais, muito vistosos. Os organizadores desse tipo de evento preferem tamanho grande, de preferência aqueles bouquets que tapam a cara de quem está a falar.

2. As instituições (mormente as públicas) que financiam as publicidades para TV entre nós deveriam ter mais noção e começar a escrutinar com conhecimento de causa as mensagens que deixam passar nessas publicidades. O último filme sobre a Casa do Direito que está a ser emitido na TCV é um exemplo de como essa avaliação crítica não é feita. Além de ser um spot longo, passa uma mensagem preocupante relativamente à responsabilidade paterna (que entre nós já é deficitária). A senhora, mãe de três filhos, triste, angustiada, lamenta porque a “ajuda?” do pai para os três filhos que tiveram juntos tem faltado. A mensagem subliminar dessa publicidade, sem querer, acredito, reforça a irresponsabilidade paterna, (porque naturaliza o distanciamento) e fere o orgulho da mãe e até dos filhos.

3. Deve estar a pensar na ligação (que não existe) entre a ilustração que usei e o conteúdo deste post…são os tais desvios (ruídos) comunicacionais.

3 de dezembro de 2009

Natal sem Dengue??! Veremos…

dengue


















Não gostaria aqui de ser repetitiva relativamente ao surto e posterior epidemia da dengue que assolou Cabo Verde, até porque este sítio é conhecido por assuntos de outra casta. Mas a dimensão do susto e as circunstâncias que ditaram, em partes, o meu afastamento prolongado justificam o conteúdo.
Comecemos pelas vítimas: o Primeiro-Ministro, tu, grande parte dos nossos amigos e familiares, eu, todos, ou quase todos... 70 % dos profissionais do Hospital Agostinho Neto (Hospital Central da Praia). Mais de 20 mil cabo-verdianos foram picados pelo mosquito aedes aegypti
Às vezes, as doenças vêm vagarosas e tacteantes, instalando-se no meio, de forma tão insidiosa que chegam a surpreender as autoridades sanitárias e, com mais propriedade, toda a população. Foi o que aconteceu com a dengue. Também à vítima, a dengue se manifesta de forma insidiosa … o mal estar inicial nunca é evidente, insinua para depois atacar e dominar.

Não que o Arquipélago não tivesse o aedes aegypti. Esse mosquito, encontrado nas regiões tropicais e intertropicais, existiu em Cabo Verde desde há muito tempo, e não chegou a ser erradicado totalmente do país.
A grande questão neste momento (e os prognósticos são muitos) prende-se com o evoluir da epidemia para o ciclo endémico, o que irá mexer profundamente com os hábitos, e não falo aqui apenas do saneamento, sabendo nós que o desafio mister é erradicar os focos vectores…

O caso do Fogo

Desde a época colonial a única ilha de Cabo Verde que continuou com o mosquito aedes aegypti foi o Fogo. Sabe-se que na ilha existem alguns hábitos típicos como as cisternas caseiras, sem falar dos bebedouros dos animais e reservatórios que são o sustento de algumas regiões encravadas. Um dos especialistas que lida com a dengue há 20 anos na Martinica, Laurent Tomás, disse durante a sua estada entre nós que essas cisternas têm de ser protegidas urgentemente por mosquiteiros especiais sob pena de continuarem a ser autênticos viveiros larvais. Acrescentou que o caso dos bebedouros dos animais é mais preocupante. Coincidência ou não, é de salientar que enquanto os casos suspeitos diminuíam em Santiago, o Fogo continuava a ter uma média relativa alta que rondava 30 casos dia. Uma questão ainda não muito bem esclarecida.

Barlavento

Além de erradicar os focos nas ilhas de Sotavento e travar a epidemia, outra preocupação das autoridades de saúde é proteger as ilhas de Barlavento onde não se registaram casos autóctones. Boa Vista foi a excepção com alguns casos notificados. E por fim, a ocorrer a endemia, aprender a conviver com a situação.
Queremos um natal sem dengue, disse o Primeiro-Ministro. Veremos! Ontem, 2 de Dezembro, registaram-se a nível do Sotavento 79 novos casos. Os lugares mais afectados foram a Cidade da Praia (43), Santa Cruz (11), Maio (9), e S. Filipe (6). No dia 1º de Dezembro, registaram-se 53 novos casos na Cidade da Praia e 20 em S.Filipe.

Saber mais na...

Grande Reportagem Dengue: uma pandemia que chega a Cabo Verde, Segunda-feira, 7 de Dezembro, depois da telenovela A Favorita, na TCV.

Eu aqui me despeço

Voltei















Eu me despeço.
Volto à minha casa, em meus sonhos.
Volto à Patagônia, aonde o vento golpeia os estábulos e salpica de frescor o Oceano.
Sou nada mais que um poeta: amo a todos, ando errante pelo mundo que amo.
Em minha pátria, prende-se mineiros e os soldados mandam mais que os juízes.
Entretanto, amo até mesmo as raízes de meu pequeno país frio.
Se tivesse que morrer mil vezes, ali quero morrer.
Se tivesse que nascer mil vezes, ali quero nascer.
Perto da araucária selvagem, do vendaval que vem do sul,
das campanas recém compradas.
Que ninguém pense em mim.
Pensemos em toda a terra, golpeando com amor a mesa.
Não quero que volte o sangue...
a molhar o pão, os feijões, a música:
quero que venha comigo o mineiro,
a criança, o advogado, o marinheiro, o fabricante de bonecas.
Que entremos no cinema e bebamos o vinho mais tinto.
Eu não vim para resolver nada.
Vim aqui para cantar e quero que cantes comigo.

Pablo Neruda

nota pura: A dengue chegou insidiosa, quase anónima. Em pouco mais de três meses provocou estragos generalizados entre nós ... e nem ´Os momentos` conseguiu ficar de fora. Mas já estamos de volta.

29 de outubro de 2009

Das paixões: jornalismo e poesia

paixões



















A última edição da Revista Máxima trouxe uma reportagem com jornalistas que em horário nobre “invadem os ecrãs e conquistam - os portugueses – pela assertividade da sua informação". Uma dessas jornalistas, Conceição Queiroz (esq.), foi nossa colega na Televisão de Cabo Verde, é moçambicana, e trabalha na editoria de Grande Reportagem da TVI. A São, como a chamo, teve uma passagem conturbada, mas muito significativa na nossa televisão pública na qualidade de Chefe de Informação. Virada para um jornalismo cidadão e sem amarras, incompatibilizava-se no dia-a-dia com o funcionalismo instalado, e o insidioso cerco do(s) poder (es). Conceição Queiróz é fiél à sua paixão. Parabéns...

Se eu fosse um padre

eu, nos meus sermões,
não falaria em Deus nem no Pecado
- muito menos no Anjo Rebelado
e os encantos das suas seduções,

não citaria santos e profetas:
nada das suas celestiais promessas
ou das suas terríveis maldições...
Se eu fosse um padre eu citaria os poetas,

Rezaria seus versos, os mais belos,
desses que desde a infância me embalaram
e quem me dera que alguns fossem meus!

Porque a poesia purifica a alma...
a um belo poema - ainda que de Deus se aparte
- um belo poema sempre leva a Deus!

nota: M. Quintana (para Tchalé, Alex, Canto da Boca, e Ana Carolina) em nome da poesia pura...

26 de outubro de 2009

A verdadeira arte de viajar

libre















A gente sempre deve sair à rua como quem foge de casa,
Como se estivessem abertos diante de nós todos os caminhos do mundo.
Não importa que os compromissos, as obrigações, estejam ali...
Chegamos de muito longe, de alma aberta e o coração cantando!


Mário Quintana

21 de outubro de 2009

Horas sem tempo

férias

































1. "Os momentos" vai de férias, e isto poderia não estar aqui escrito, mas a verdade é que a blogosfera é um espaço relacional muito sensível, e isso não é pouca coisa. Interlocutores com interesses e disposições dos mais diversos, onde a afectividade e a partilha determinam estradas.

2. Retiro-me por uns dias… para a companhia das horas que não obedecem ao tempo.

Mário: o inorgânico


















Se respondo ao nome de Mário
É por hábito de o trazer sempre ao ouvido.
É também por hábito
Que ao grito: cabo-verdianos!
Acorro logo afogado.

Mon pays est une musique

Canal: TCV
Dia: Quarta-feira, 21 de Outubro
Horário: 22 horas

20 de outubro de 2009

Nova África: a oportunidade do discurso

José Maria Neves














José Maria Neves exibe a partir de agora mais um título: Doutor Honoris Causa pela Universidade Cândido Mendes, Rio de Janeiro. Na TCV ouvimos do Reitor dessa Instituição que o fortalecimento da democracia cabo-verdiana deve muito ao trabalho do primeiro-ministro, "um seguidor de Amilcar Cabral". Neves, por sua vez, diz que Cabo Verde tem se despontado como uma nova África, mais promissora, onde a boa governação é uma premissa.

Bem ou mal, esse princípio se ramifica e vem ganhando consistência, e prova disso é o dito Reitor citando o discurso de Obama em Istambul, referindo a Cabo Verde como um exemplo extraordinário em África.

Mas numa coisa havemos de estar de acordo: durante algum tempo, a estabilidade e a democracia cabo-verdianas fez nascer em nós (mais uma vez) um discurso e por vezes a sensação de estarmos distantes da África, mais próximos do abstracto atlântico e da Macaronésia. Uma visão redutora que já não resulta, apesar da Parceria Especial com a União Europeia (que também se dá no âmbito da nova África).

Diante disso, ganha a oportunidade do discurso, até porque sabemos que as disputas, a nível interno, não dependerão desse emblema de "estabilidade e boa governação" que rende muito lá fora.

19 de outubro de 2009

Jornalismo vs culto de personalidade

Cult of personality

















Esperei para ver em algum jornal on-line, impresso, ou outro fórum qualquer, uma reacção da Universidade Jean Piaget à carta da Presidente da Câmara Municipal de S. Vicente endereçada ao Conselho de Administração da RTC (alguns trechos foram publicados no A Semana on-line): as questões da forma como foram colocadas são por si só subsídios para fundas abordagens sobre o “hábito jornalístico nas ilhas” e, sobretudo, a visão enviesada que alguma classe política cabo-verdiana tem desse metiér. A Universidade Jean Piaget, como a única instituição que se dedica ao ensino do jornalismo neste país, tem por obrigação encarar este desafio. Personalidades como Isaura Gomes estão tão mal habituadas, a ponto de começarem a exigir, sem pejo algum, tratamentos “jornalísticos” especiais, enquanto autoridades. Diante disso, faço o meu legítimo exercício nas alíneas seguintes:

1. As reuniões ordinárias das Câmaras Municipais não merecem ser elevadas à categoria de notícia, porque fazem parte da rotina da equipa camarária que, a priori, sabe-se, foram eleitas também para tomar decisões. Uma cobertura transforma-se num servilismo (que se convencionou tomar por um direito adquirido) para mostrar o quanto trabalham os eleitos municipais.

2. As reuniões de Conselho de Ministros, salvo em raríssimas excepções, alinham-se na mesma normalidade da primeira, por isso, mostrar todas as quintas-feiras os tantos decretos e projectos de lei aprovados e apreciados pelo Governo só serve para cansar os telespectadores e reduzir à completa nulidade o trabalho jornalístico.

3. Nada mais desinteressante do que um ministro, autarca, director-geral, ou presidente de instituto de regresso ao país, que resolve dar uma conferência de imprensa para falar dos encontros, ganhos e acordos efectuados no exterior. E o jornalista que não esteve presente terá ou não motivos para duvidar desses relatos!?

4. Assinatura de acordos, não importa os domínios, é outro assunto que deveria passar ao largo. A quem, a quantos, e de que forma interessa assistir ou ler sobre a assinatura de um acordo para a obtenção de recursos que visam isso ou aquilo?

5. A título de exemplo, a visita de Catarina Furtado a Cabo Verde não é assunto para cobertura jornalística. E a sua apreciação sobre o nosso Programa de Saúde Reprodutiva, seguida da declaração de que “em Cabo Verde estamos melhores” não deveria merecer qualquer destaque jornalístico, por razões óbvias.

6. Todos sabem que a Senhora Presidente da Câmara Municipal de S. Vicente é a autoridade máxima da ilha, mas "exigir" aos jornalistas que não dêem voz off nas peças em que participa, e dispensar atenção especial à sua pessoa, em detrimento dos “inferiores hierárquicos” da ilha é, sem dúvida, das reivindicações mais alucinantes e inadequadas que uma autoridade conseguiu colocar em forma de carta. É caso para perguntar, nestas paragens, quem anda a dar as cartas no jornalismo?!

17 de outubro de 2009

Les choses qu`on dit, et toi

femme




















1. Comemora-se manhã o dia nacional da cultura, data que começou a ser assinalada em 2006 em homenagem ao poeta escritor e jornalista, Eugénio Tavares, nascido a 18 de Outubro de 1867. Consta que as comemorações deste ano acontecem fincadu na raiz para satisfazer os críticos que em celebrações anteriores apelidaram de elitistas algumas actividades levadas a cabo. Pessoalmente, desconhecia esse barulho. Curiosamente, nisso tudo, o que salta à vista é a febre dos museus: em 2005 nas comemorações ocorridas na Brava, o Ministério da Cultura inaugurou, depois de parcialmente recuperada, a casa onde viveu Eugénio Tavares, que seria imediatamente transformada em museu. O espaço continua inactivo, como se sabe, e partindo daí, pode-se inferir “a dinâmica” dos outros “museus” do país, euforicamente inaugurados nessa data que se repete a cada ano.

2. Club Voz di Povo desponta como um lugar agradável e badalado em pleno coração do Plateau. O espaço anexo à sede da Associação dos Jornalistas de Cabo Verde, vai se compondo à mercê dos frequentadores, e parece que veio para ficar. Para já, cinema documental às quintas, e música ao vivo às sextas são ofertas garantidas: a ideia da gerência é preencher cada dia de semana com um programa diferente. O espaço que é acolhedor oferece também opções de estada: a penumbra do interior, o frescor do pátio, ou a informalidade da entrada. Carlos Veiga, novamente presidente do MPD, deu uma passada rápida no club, na quinta passada.

3. “Um marciano que decida conhecer os cabo-verdianos através dos fóruns electrónicos seria capaz de pensar que somos um povo em guerra civil declarada”, José Vicente Lopes.

4. Acredito inabalavelmente nas coincidências da vida.

13 de outubro de 2009

Carla: la dame essenciel

Carla Bruni





























Depois das polémicas palavras de Nicolas Sarkozy dirigidas aos emigrantes (principalmente africanos) em França, enquanto Ministro do Interior, e de muitos outros atropelos ministeriais, nada fazia prever que ele viria a ter uma passagem tolerável na Presidência da República. Até o momento, Sarkozy tem provocado algumas supresas, mormente no plano internacional, e deixado em relativo silêncio os seus opositores. Mesmo antes da eleição de Barack Obama, aproximou-se calorosamente do futuro presidente dos Estados Unidos, e hoje são uma espécie de melhores homólogos, numa analogia a melhores amigos.
Mas tudo isso reside no plano das percepções, o que conta na política. Internamente, não se pode dizer que é tudo maravilha. Até porque a notícia de indicação do filho sem experiência para a presidência da maior empresa financeira do país, não combina muito com o que acabamos de escrever.

Carla

Parece, entretanto, que enquanto Ministro do Interior, Sarkozy levava uma vida um pouco sem graça, e com laivos de stress (é o que transparecia). Lembre-se que o homem mais poderoso da França era tido entre os franceses como um anti-intelectual, pouco dado às lides das artes, da música, do teatro. Tudo isso vem mudando depois do seu casamento com a italiana Carla Bruni, modelo e cantora oriunda de uma família rica e “in” de Torino. A imprensa, nomeadamente francesa, tem registado e dado realce, nos últimos tempos, às saídas artísticas e descontraídas do presidente sempre na companhia da primeira-dama que, apesar das amarras do título, não mudou em essência os seus bons hábitos.

A propósito… o tal ditado: atrás de um grande homem existe sempre uma grande mulher.

foto: daqui

Sua Boca e Olhos Seus

M


















Sua boca nunca eu soube
Nem a cor dos olhos seus
Sei que depois que os vi
Nunca mais vivi.

Mário Fonseca

12 de outubro de 2009

Falo de Ti às Pedras das Estradas

i love you ...
















Falo de ti às pedras das estradas,
E ao sol que e louro como o teu olhar,
Falo ao rio, que desdobra a faiscar,
Vestidos de princesas e de fadas;

Falo às gaivotas de asas desdobradas,
Lembrando lenços brancos a acenar,
E aos mastros que apunhalam o luar
Na solidão das noites consteladas;

Digo os anseios, os sonhos, os desejos
Donde a tua alma, tonta de vitória,
Levanta ao céu a torre dos meus beijos!

E os meus gritos de amor, cruzando o espaço,
Sobre os brocados fúlgidos da glória,
São astros que me tombam do regaço!

Florbela Espanca, in "A Mensageira das Violetas"

10 de outubro de 2009

Saul Bellow

bellow


















“Através das frestas da persiana passou a fixar as rochas castanhas do parque, salpicadas de mica, e o optimista verde de Junho que em tudo se infiltrava. Em breve se cansaria, à medida que as folhas alastrassem e Nova Iorque impregnasse com a sua fuligem o Verão. Era, contudo, especialmente belo agora, pleno de vida em todos os pormenores – os rebentos, os pequenos ramos e as formas verdes subtilmente entumescendo. A beleza não é uma invenção humana.”

in Herzog: pág.20.

nota pura: quem assim escreve não é humano

9 de outubro de 2009

Obama, Saúde Mental, 2011...

Obama















1. Barack Obama foi laureado pela Comissão Nobel entre duzentos candidatos com o Nobel da Paz. O argumento da comissão referencia que Obama “destacou-se no seu primeiro mandato pelo seu esforço em prol de um mundo livre de armas nucleares, e no combate às mudanças climáticas”. Mas há mais: Guantánamo, a sua passagem pelo Gana e Egipto e as mensagens que semeou nesses países, o diálogo com o Irão… a grande batata quente chamada Afeganistão. E sobretudo, o diálogo com o mundo árabe. Paradoxalmente, pensamos, a distinção só irá complicar as difíceis decisões que o Presidente dos Estados Unidos tem pela frente, mas pronto, estamos eufóricos por Obama, por inconfessáveis razões.

2. Comemora-se hoje Dia Mundial da Saúde Mental, e mais uma vez a dirigente desse serviço aparece na TCV falando de projectos de formação de formadores: nunca percebo onde pretendem chegar com essa visão a longo prazo! Lembro-me, nos anos anteriores, de discursos semelhantes, ideias parecidas, e nada de concreto que beneficiasse as pessoas afectadas por esta doença. É sabido que em Cabo-Verde dois médicos abnegados dão tudo de si em prol da saúde mental: Manuel Faustino e Daniel Silves Ferreira. Ocorre-me agora as crónicas do Sr. Zuca Lima Barber, enfermeiro residente na Ilha do Fogo há largos anos, denunciando a situação deprimente em que vivem os tantos doentes mentais da Cidade de S. Filipe, sem que as autoridades, em momento algum, movessem uma palha.

3. À minha volta já é 2011!

Bom fim-de-semana

8 de outubro de 2009

Viagem para os cais de sempre

good sensation

























1. Hoje, bem cedo, fiz um programa peculiar na companhia de um operador de imagem. Saímos às 7 horas do Cais da Praia no Princess Marine, e uma hora e 40 minutos depois já estávamos ancorados no Cais de Vales Cavaleiros, na Ilha do Fogo. De seguida, tempo apenas para o desembarque dos passageiros e cargas, seguimos rumo à Ilha Brava, e 15 minutos depois entramos no Cais de Furna. Não demoramos muito na Brava, tempo apenas para beber uma água, enquanto enbarcavam os passageiros da Ilha de Nhô Eugénio. Voltamos com o mesmo pique e uma e media da tarde, abraçamos o Cais da Praia.
Um verdadeiro acontecimento que vai abrir um novo episódio na até então precária ligação marítima inter-ilhas a nível de Sotavento. Estreitando distâncias e dinamizando a circulação de pessoas, esta aquisição chega numa altura crítica, em que algumas ilhas, como a Brava e Maio, já davam sinais de isolamento agravado. Agora, todos os dias, Maio, Fogo e Brava estão logo ali, a pouquíssimas horas da Capital.

2. O Cais dos Vales Cavaleiros, apesar dos discursos e de infindáveis promessas continua a ser o de sempre. Ano entra, ano sai, nada muda. Nem o barracão que serve de lanchonete consegue surpreender, pelo aspecto, já que os salgados e a cachupa guisada marcam o paladar. Inesquecível mesmo continua a ser as piadas dos estivadores da minha ilha.

3. Sobre o porto da Furna, na Ilha Brava, não diria muito diferente; mas aí a desolação é mais profunda, e o deserto de gente indicia um profundo abismo ilhéu.

5 de outubro de 2009

Nós filosofia...

filosofia















(…) “tanto a filosofia como a política têm de ser de promixidade.”

“Nós encontramos o Primeiro-ministro no Café Sofia, na Praia, os governantes vão tomar banho na Quebra Canela e encontramos também o professor de filosofia a ter uma relação muito próxima com os estudantes. Essa ideia da filosofia da afectividade, encontrámo-la aqui na prática. Quando se fala de filosofia, a primeira ideia que vem a pessoa são terrenos meramente conceptuais. A filosofia aqui tem de cheirar à vida.”

fala: Carlos Belino (professor de Filosofia na UNI-CV), in: Expresso das Ilhas
imagem: Tchale Figueira

2 de outubro de 2009

Mário Lúcio ganha "Prémio Carlos de Oliveira"

Mário Lúcio






















“A obra se distingue de todas as outras apresentadas a concurso”. Esta é a primeira nota da acta do júri em relação ao “Novíssimo Testamento”, romance do músico e escritor cabo-verdiano Mário Lúcio. O livro foi o vencedor do Prémio Carlos de Oliveira, destinado aos escritores em língua portuguesa, numa lista de 67 obras concorrentes. “Novíssimo Testamento” é uma fábula que nasce de uma revelação fotográfica, em que Jesus Cristo é uma mulher, e conhece assim novos desafios e provações.
O autor que recebeu a notícia do prémio com uma gargalhada disse que “nesse novo mundo, nessa nova era, Jesus após a ressurreição, no livro, é uma mulher, e isso coloca uma outra leitura do mundo, outras construções, outras imaginações..."

O País Santoral que é Cabo Verde é o palco do "Novíssimo Testamento" de Mário Lúcio. As ilhas de Santiago, São Vicente e Santa Luzia, e um apanhado das suas reminiscências perante Jesus Cristo dão o mote à obra.
Em S. Vicente onde tudo é levado a uma vivência mais divertida, Jesus se sente uma super star no Carnaval”. Ou em Santa Luzia onde Jesus faz a sua travessia do deserto e diz que “a única ilha com nome de mulher e nunca teve um filho nas suas entranhas”.

Um domínio da escrita “notável”, “uma poderosa efabulação”, “muito humor”, e um forte “domínio do religioso” são outros itens pontuados pelo júri. O romance de Mário Lúcio escrutina o Novo Testamento, numa perspectiva histórica, e explora todas as dúvidas pós ressurreição vividas por Jesus. Tudo isso, graças à tolerância do Cristianismo, disse-nos Mário Lúcio.
O valor do prémio literário Carlos de Oliveira é de 5.000 mil euros, e será suportado pela Câmara Municipal de Cantanhede, (Portugal) uma das promotoras do concurso ao lado da Fundação Carlos de Oliveira. A publicação da obra também será assegurada pela autarquia.

Infância

Sonhos
enormes como cedros
que é preciso
trazer de longe
aos ombros
para achar
no inverno da memória
este rumor
de lume:
o teu perfume,
lenha
da melancolia.

Carlos de Oliveira, in 'Cantata'

bom fim-de-semana

30 de setembro de 2009

A Idade de Ser Feliz

elle




















Existe somente uma idade para a gente ser feliz,
somente uma época na vida de cada pessoa
em que é possível sonhar e fazer planos
e ter energia bastante para realizá-los
a despeito de todas as dificuldades e obstáculos.

(…)

Essa idade tão fugaz na vida da gente
chama-se PRESENTE
e tem a duração do instante que passa.

autor: desconhecido

29 de setembro de 2009

1, 2, 3, 4, 5 gaffes...

etrange












1. Estados Unidos emitem um mandato de captura contra o realizador polaco Roman Polansky, e Suiça cumpre. Sem dizer que o cineasta foi participar no Festival de Cinema de Zurique onde era o homenageado (falta de decoro!). Impossível de perceber é a motivação, hoje, do país de Barack Obama em capturar e prender um homem como Polansky.

2. Até quando Sílvio Berlusconi irá continuar com as suas “gaffes”?! (é este o doce termo que usa a imprensa europeia). Na sua última derrapagem pública, incluiu Michelle Obama na lista dos “bronzeados”, onde pôs Obama há muito. Desta feita, o que se depreende “da fala” de Berlusconi é uma manifesta inaptidão para conseguir ombrear com uma diva como Michelle. Freud explica...

3. Porque será que o Papa Bento XVI da sua Basílica (que não fica longe) não condena o racismo primário de Sílvio? Não o percebe?

4. O Ministério da Cultura de Cabo Verde, a crer nas últimas aparições, persegue novos objectivos e demonstra novas ambições, sem nos darmos por isso.

5. Logo a seguir à reunião dos G20, de onde não saiu decisão alguma (mas sobre isso, nem uma palavra), eis que surgem os media de sempre a escreverem que a Cimeira América Latina/África na Venezuela não deu em nada.

28 de setembro de 2009

Polansky, preso?!

Roman





















Gosto de Roman Polansky, por isso fiquei triste com esta notícia, e decidi recupar o texto que escrevi há dois meses aqui.

Saio de uma mente brilhante para entrar numa outra: a do realizador polaco Roman Polanski (foto). Dos vários filmes que adensam a excelente carreira cinematográfica de Polanski, creio que “O Pianista” condensa o que de “definitivo” esse realizador desenhou para o seu percurso. O próprio reconheceu, aliás, esse feito.Varsóvia, 1937, Segunda Guerra Mundial. Um pianista judeu e sua família sobrevivem ao aperto do certo alemão. É um tempo de privação e de provação dos judeus. As restrições de circulação e acesso. A versatilidade e a genialidade do Wladyslaw Szpilman. A paixão deste por uma jovem alemã. O surgimento dos guetos (a retirada de Varsóvia), os assassinatos à calha e, finalmente, o campo de concentração e o extermínio. A esse destino, escapa o pianista para um sofrimento mais pausado, dilacerante e humilhante. A música e o piano salvam-no. E é ajudado, inclusive, por um oficial alemão que no fim, no reverso da situação, vai precisar da mesma compaixão.

O Pianista arrebatou Palma de Ouro no Festival de Cannes de 2002. Um enredo de diálogos esparsos e definitivos, impressionou o Júri. O silêncio, os espaços entre o tempo, a cor acinzentada, a música sempre presente anunciando algo que nunca chega, capta a sensibilidade de todos que enfrentam este filme, diga-se. Polanski, ele próprio, cresceu num dos guetos de Varsóvia e perdeu os pais num Campo de Concentração. Entretanto, ele não assume que O Pianista tenha algo de autobiográfico. Wladeck, o protagonista ficcionado, existiu realmente e é autor de O Pianista, Romance. Só veio a falecer no ano 2000. Com 88 anos.

São alguns factos de que recordo”, afiança, entretanto, o cineasta. A intensidade (ainda que fria) do filme O Pianista chega a ser sensorial, dir-se-ia que somos transportados pelas ruas de Varsóvia e, por um instante, experimentamos as excrescências da desumanidade: a indignidade, a morte e, mais que isso, ao verdadeiro extermínio da alma humana…

Em fuga...

Como tem dado conta o desenrolar da situação, há mais de 30 anos que Polansky não pisa os Estados Unidos, país onde realizou os filmes mais emblemáticos da sua carreira. Esse alegado crime sexual faz do cineasta um fugitivo e só agora na Suiça, por intermédio de um mandato de captura americano de anos, Roman Polansky foi preso. O caso já beira a incidente diplomático e os admiradores de Polansky dizem-se envergonhados.

Saudade do futuro

saudades do futuro






















O presente e o passado
estão talvez ambos presentes no futuro
e o futuro está contido no passado.
Se todo o tempo está eternamente presente
todo o tempo é irredimível.

O que podia ter sido é uma abstracção
permanecendo uma possibilidade perpétua
apenas num mundo de especulação.
O que pode ter sido e o que foi
apontam para um fim único, que é sempre presente.

Elliot

nota pura: apesar das palavras que não te disse!

26 de setembro de 2009

Mário…em nós incluído

Example

















Morreu à meia noite de ontem, vítima de um AVC, Mário Fonseca, um dos maiores poetas cabo-verdianos, contemporâneo de Arménio Vieira, Corsino Fortes e João Vário. O autor do célebre poema “Quando a vida nascer” cultivou a poesia, tanto em língua portuguesa como em língua francesa, e deixa uma bibliografia de elevada referência para a literatura cabo-verdiana.

Sob o título“Mon Pays est une Musique” publicou em vida os livros de poesia: Près de la Mer, Mon Pays est une Musique e Poissons, deixando na calha a obra “Morrer Devagar”, em ponto de publicação.

Fonseca cultivava uma escrita universalista e não telúrica, de profunda inquietação humanista. Para além de poeta, era professor, ensaísta e colunista. Tinha uma coluna semanal no jornal Expresso das Ilhas, e colaboração dispersa em vários periódicos e revistas nacionais e estrangeiros. Foi Presidente do Instituto Nacional da Cultural, durante os anos noventa, e chegou a ser nomeado presidente do Instituto Internacional da Língua Portuguesa, cargo que não chegou a ocupar por motivos de saúde.

Mário Fonseca foi também combatente da liberdade da Pátria, no período colonial, tendo sido não só preso político em 1961, como companheiro de Amílcar Cabral em Conacri.
Era admirador confesso dos poetas da língua francesa, de que se destacam os clássicos Charles de Baudelaire e Arthur Rimbaud, bem como dos mais contemporâneos como René Charr, Aimé Cesaire e Leopold Sédar Senghor, de quem fora amigo pessoal. Mário Fonseca exerceu uma pedagogia cultural junto aos poetas cabo-verdianos mais jovens, revelados nos anos 80 e 90.

No pórtico da obra “Se a luz é para todos”, Mário Fonseca escreveu o seu vaticínio essencial:

O que vos digo: nada me exclui
De nada. Estou incluído em tudo.
Tudo está incluído em mim. Mesmo
Depois de morto estarei em vós incluído
.


Foto: Mito Elias

25 de setembro de 2009

Tome nota ...
















A série Grandes Temas Cabo-verdianos (2009) produzida pela Televisão de Cabo Verde, e criada pela autora deste blog começa a ser emitida amanhã na RTPÁfrica. São doze episódios com emissão semanal aos sábados e repetição aos domingos.

Sábado: 10 horas (hora de Lisboa)
Domingo: 17:15 horas (hora de Lisboa)

Aos leitores, amigos e cabo-verdianos que perguntavam sobre a possibilidade de ver o programa a partir da diáspora deixamos esta informação. Tome nota dos temas:

1 .Descoberta de Cabo Verde
2. Na Rota dos escravos
3. Diáspora Cabo-verdiana
4. O Espectro da Fome
5. Independência de Cabo Verde
6. Abertura Democrática
7. Caboverdianidade
8. Bilinguismo em Cabo Verde
9. Cabo Verde na Subregião Africana
10. Ensino Superior e o Desafio do Conhecimento
11. O Encanto da Música
12. Kudi Baxon na Banderona

A conquista do véu...

véu




















Henry Miller, Ítalo Calvino e Vladimir Nabokov são alguns dos meus autores preferidos por uma razão em comum. Muito além das suas escritas, individuais no percurso, esses autores oferecem ao leitor a possibilidade de alargar horizontes, pela forma peculiar como se referem aos livros que os marcaram. Qualquer leitor interessado pode, por essa via, elaborar uma lista curiosa de leitura recriando critérios de escolha.
O mesmo acontece com a escritora iraniana Nazar Nafisi no seu livro “Ler Lolita em Teerão”. Antes de iniciar a leitura, condicionada pelos últimos acontecimentos no Irão, imaginei que o livro se restringisse aos insólitos da obra Lolita, de Nabokov, e as proibições de leitura num meio revolucionário e dominado pelo radicalismo islâmico. Mas Nafisi vai muito além e propõe uma lista essencial entre títulos e autores: o próprio Nabokov, Henry James, Monte dos Vendavais, entre outros. Dos escritores sobressaem, à semelhança da autora, o paradoxo do tensionamento psicológico em face da (s) ideologia (s) da escrita.
Nafisi, no “Ler Lolita em Teerão”, traça uma radiografia não necessariamente linear da vida no Irão no período revolucionário: a divindade de Komeini, o papel desempenhado pelos jovens, os intelectuais, o lugar da universidade e do seu apoderamento político e islâmico, a guerra entre Irão e Iraque, etc. Percorrendo esses caminhos todos, a escritora demonstra o poder invencível das ideias, da convicção e da luta pela liberdade na qual acredita.
O que se percebe no livro e de modo incontornável é o lugar da América e do Ocidente como antítese conducente às radicalizações político-religiosas. E disso depreende-se uma disputa de civilizações com bases históricas muito enraizadas, mas bastante difusas.

Da actualidade africana...

Saindo do livro, mas continuando nessa dualidade, é curioso olhar o actual cenário islâmico em África (continente fortemente marcado pela colonização). Ascende no continente sorrateiramente um sentimento anti América, que, muitas vezes, em se tratando de religião, leva a questionar qual o lugar da crença e da profecia em si. O Islão, como religião oficial, configura-se como um claro objectivo no continente; as várias frentes radicais islâmicas criam terror sob pretexto do anti-americanismo, os apoios multiplicam-se, e caminhamos a passos largos para um confronto civilizacional.

Da diáspora ...

As ramificações do islamismo que percorrem o Sahra, e atravessam o Mar Vermelho e o Mar Mediterrâneo banham toda a parte. Amin Malouf propõe, por exemplo, um “pacto laico internacional”, à semelhança do ocorrido em 1648 com o Tratado de Vestefália. A situação não se augura pacífica, pois uma parte do mundo ainda acredita que uma guerra pode ser santa…

imagem: autora do blog rendida ao véu na Líbia

22 de setembro de 2009

A escravatura, o jornalismo e o abismo

tempo















Ao longo dos cinco anos deste blog a escravatura tem sido um tema recorrente. Desde logo pelo peso histórico que a Cidade Velha teve na afirmação do tráfico de escravos, e do papel incontornável que desempenhou nesse comércio transatlântico. Mas a maioria dos textos que aqui escrevíamos fazia referência à não existência no país de um Comité de Rota de Escravos. O projecto da UNESCO sobre a Rota de Escravos nasceu em 2004 no Benin com o intuito de promover estudos e pesquisas sobre tal tragédia humana com vista a potenciar ao nível turístico, académico e outros os sítios que foram palcos da subtração, passagem, ou chegada dos escravos. A ideia de fundo passava pelo fim das lamentações, e pelo inaugurar de uma nova forma de se lidar com esse episódio horrendo da história que epicamente deu novos mundos ao mundo. Todos os países com passado escravocrata, mormente aqueles que ainda precisam de ajudas de terceiros para levar adiante os seus projectos, aderiram ao projecto Rota de Escravos criando os seus Comités nacionais. Paradoxalmente, Cabo Verde é uma excepção. Inclusive trabalhos esparsos nessa matéria foram produzidos por historiadores nacionais, mas no âmbito do Comité Português.

Estranhamente só agora, 15 anos passados, e depois de participar numa reunião sobre a escravatura na Guiné Equatorial, vem o presidente do INIPC (Instituto de Investigação e Promoção Culturais) que será eventualmente a primeira entidade responsável por essa matéria, falar da importância deste projecto e da necessidade de se recuperar o tempo perdido. De recordar que há mais tempo Cidade Velha poderia ser considerada Património da Humanidade, com mais sustentabilidade e de forma mais conseqüente, principalmente aos olhos de quem hoje a vê. É que o reconhecimento da história passa por encarar o presente.

Do jornalismo ao abismo

1. Pergunta – Em que medida a internet contribui para o jornalismo?

Daniel Jean director da `Nouvel Observateur`– Para os jornalistas, a internet traz o gosto pela velocidade. A possibilidade de qualquer pessoa responder a qualquer pessoa. Ou o fato de que todo mundo possa ser jornalista e, nesse caso, que os próprios jornalistas deixem de acreditar neles mesmos, porque são questionados a todo momento. Está se produzindo um descrédito na função do jornalista.
Daniel Jean falava a respeito do seu ultimo livro ´Com Camus – Como aprender a resistir´ (assunto para um post qualquer dia destes)

2. “Quando se olha muito tempo para um abismo, o abismo também olha para nós”. (Nietzsche)

18 de setembro de 2009

Verde afã de uma palavra vã






















Cabo Verde!

Serás tu
vã expressão
neste diário afã
de te querer verde?

Serás tu
fútil alcunha
vilipendiando
os semblantes nossos
de rocha nua e agreste

fátuo cognome
deste chão basáltico
de perfil verde

mera denominação
deste torrão famélico
de espasmos verdes

ou tão só verde nome
espoliado à esperança

baptismal e irónica nomeação
da fraternidade da semente

que no pesadelo da erosão
da terra mulata e estéril
faz crescer acácias
nem verdes nem rubras?

Serás o verde
que nas áridas achadas
do seco lugar sonhado cabo verde

canta a mão que semeia
e faz germinar
pés árvores de sonho

ou tão só
o verde que acaba
e ressurge nos sonhos de amanhã
do retorcido cabo da enxada?

Caboverde!

Serás tu palavra vã
ou o infinito enredo
o íntimo desvelo
de um verde afã?
autor: Nzé di Sant’ y Águ (versão refundida)

17 de setembro de 2009

A Chuva e o Património




















A Vila da Ribeira Brava em S. Nicolau (fotos) foi elevada, no passado dia 6 de Agosto, à categoria de património histórico Nacional. Os argumentos do governo dizem que “a vila da Ribeira Brava tem monumentos que pela sua arte, pela sua beleza, pelo seu cunho histórico necessitam de uma especial consideração e preservação”.

Todos se lembram que a meio ano de mandato o actual presidente da Câmara de Ribeira Brava já fazia obras no sítio com o intuito de melhorar a cara de Stancha (como é popularmente conhecida) tendo em mente o sonho de património.

O espaço que há sensivelmente um mês completou 278 anos da sua elevação à categoria de vila, e considerada por muitos “o berço da intelectualidade cabo-verdiana”, passou por uma verdadeira catástrofe nos últimos dias, devido às fortes chuvas que caíram na ilha, causando danos impensáveis em todo o São Nicolau. O edil da vila chegou mesmo a dizer que “a chuva não é mais bem vinda nesta ilha”. O que não se sabe, é até que ponto esses estragos perigam o título recentemente conseguido.

Canção do amor imprevisto

tendre

















Eu sou um homem fechado.
O mundo me tornou egoísta e mau.
E a minha poesia é um vício triste,
Desesperado e solitário
Que eu faço tudo por abafar.

Mas tu apareceste com a tua boca fresca de madrugada,
Com o teu passo leve,
Com esses teus cabelos…

E o homem taciturno ficou imóvel, sem compreender
nada, numa alegria atônita…A súbita, a dolorosa alegria de um espantalho inútil
Aonde viessem pousar os passarinhos

Mário Quintana

11 de setembro de 2009

Thaiti, e (os anos que passam)...

momentos




















Em homenagem a Amílcar Cabral, patrono da pátria cabo-verdiana, que, amanhã, faria 85 anos se estivesse vivo, três organizações da sociedade civil organizam esta tarde uma mesa-redonda sobre a zona do Thaiti, com enfoques no valor intrínseco do espaço e nas intervenções urbanísticas e outras em projecto. O debate na Biblioteca Nacional logo mais promete.
Várias são as margens e as virtualidades desse espaço onde outrora funcionara a Aguada da Praia e os armazéns da Companhia de Grão Pará e Maranhão, e hoje ostenta o Memorial Amílcar Cabral.
Alguns projectos de intervenção urbanística recaem, entretanto, sobre a zona do Thaiti. Apesar de aprovados pela edilidade, tais projectos enfrentam a desaprovação de certa franja esclarecida da população que não quer ver descaracterizada e alienada o potencial ambiental, histórico e patrimonial de um dos espaços mais emblemáticos da capital.
Um dos mais acérrimos críticos de intervenção urbanística no local é o arquitecto Pedro Martins que desaprova quaisquer intervenções que não se balizem pela reconstituição da área verde, com vocação de reserva botânica, a reconfiguração da antiga Aguada da Praia, marco fundacional da cidade, e a compatibilização dos vários aspectos potenciais desse espaço num quadro de um futuro Plano Urbanístico Detalhado.
A Associação Pró Praia e a Câmara Municipal da Praia são as outras instituições que irão ser parte desse debate.

Os anos ...

"Os Momentos" completou 5 anos no passado dia 30 de Agosto …e pensar que parece há dias em pleno 2004 quando tudo começou. A todos, amigos, conhecidos, visitantes, e já agora admiradores secretos (sim, os há) toda a ternura dos momentos vividos com poesia! Continuamos por aqui…

9 de setembro de 2009

A estrela e o crepúsculo ...

Ilca Andrade
























Ilca Andrade vai participar hoje em mais uma sessão eliminatória, e está bem posicionada no concurso do Helbent for Hollywood. Tem a garantia de que irá continuar até o final da maratona, o que quererá dizer que aqueles que ainda não votaram poderão fazê-lo através da página http://www.hellbentforhollywood.com/ no nº 205. Vote for her!


Grita

(...)
Quando chegares,
Amor à minha fonte distante,
desvia-me as vertentes,
aperta-me as entranhas.
E uma destas tardes - Amor de mãos cruéis -,
ajoelhado, eu te darei graças.

Pablo Neruda, in "Crepusculário"

7 de setembro de 2009

O silêncio dos (não) inocentes

Example





















Aconteceu na passada semana em Tripoli, capital da Líbia, uma Cimeira extraordinária da União Africana (UA) que “coincidiu” com a comemoração dos 40 anos da Revolução Líbia. O tema central do encontro incidiu sobre a questão dos conflitos em África, algo crucial para a União. Os países membros são unânimes em quererem ultrapassar a questão e assentar as energias no desenvolvimento do continente. Justíssimo e a questão é urgente!
Mas não terá sido essa a perspectiva de algumas agências noticiosas e de imprensa europeia. Estes centraram os seus olhares críticos sobre o presidente líbio Muahamar Kadhafi, também presidente em exercício da UA, e minimizaram a intervenção de Hugo Chavez, presidente da Venezuela, (foto) que sobre a questão deixou pistas interessantes para a convergência de blocos em prol de uma nova frente política credível e alternativa. Este anunciou o encontro de Caracas, em Setembro (26), sempre na linha do princípio da Cimeira de Tripoli, reiterando o convite a todos os Chefe de Estados africanos presentes no acto. Uma espécie de “aggionarmento” dos Não-Alinhados, bloco nascido depois da famosa Conferência de Bandung.
A própria comemoração dos 40 anos da Revolução Líbia aconteceu sob o signo da União. Uma simbologia bem conseguida que pode reforçar os ideais da UA e motivar os africanos para a “próxima etapa”, momento que o continente bem necessita.
Se fizermos um browsing pela Internet iremos encontrar em termos de notícia muito pouco esforço, pouca crença ou, então, os mesmos ataques, os mesmos exercícios de agendamento e de silenciamento a que já nos habituaram algumas agências noticiosas e alguma imprensa de grande alcance.
Não que venha aqui defender a Cimeira, até porque todos sabem quão inócuos são alguns encontros internacionais, inclusive os da ONU, por exemplo, sobre infindáveis assuntos, sejam relacionados com a África, sejam os com outras regiões do planeta. A situação dos conflitos em África ou noutras paragens não foge à regra.
Muhamar Kadhafi disse, por exemplo, que os conflitos em Darfur são sustentados por organizações israelitas com o apoio de França. No caso do Congo, sabe-se de empresas estrangeiras que exploram os minerais e alimentam conflitos, porque percebem que enquanto isso enriquecem à custa da miséria e da morte das populações. A tragédia consegue ser um grande negócio. Mas, perante tais acusações feitas de forma directa e à cara das centenas estadistas e jornalistas, provoca enorme melindre o silenciamento e/ou a reacção desviada. Estranha atitude a dos media a permitirem que assaz acusação descaia para a “normalidade”...
É que, no fundo, como mostrou o realizador belga Renzo Martens em Enjoy Poverty, alguns interesses instalados não estão interessados no fim dos conflitos em África. Para Martens, os fotógrafos não teriam barrigas desnutridas para fotografar, as televisões não teriam assuntos para directos, as organizações humanitárias perderiam as suas causas. Sobretudo, o Ocidente não criaria o muro que o separa do Inferno, criado, em parte, pela sua ferocidade imperial. O status quo interessa. É o silêncio dos (não) inocentes. Ademais, é muito, mas muito mais, excitante continuar a atacar Kadhafi, Chávez, Fidel, Mugabe, e, com isso, prolongar os modelos, as perspectivas, e os olhares dominantes. Até quando?

nota pura: a autora do blog acompanhou a Cimeira de Trípoli

29 de agosto de 2009

Vote for her

Example





























A jovem cabo-verdiana Ilca Andrade é uma das 100 participantes no concurso Hellbent for Hollywood, um programa de casting inovador, criado por um conjunto de produtores americanos. Desse concurso os dez actores mais votados saem directo para um reality show, que finalmente vai seleccionar a estrela, que terá todas as oportunidades de brilhar no universo hollywodiano. Ilca Andrade já vai na décima primeira posição, e todos (caboverdianos ou não) podem, através do site http://www.hellbentforhollywood.com/, votar no nº 205.
Ilca Andrade nasceu na Cidade da Praia, fez o liceu nos Estados Unidos e formou-se em artes cénicas na Clark University. Já participou em alguns filmes e vários comerciais de marcas diversas. Neste momento vive em Los Angeles.
O concurso que tem sido muito participado nos Estados Unidos, termina esta segunda-feira, e aqui todos têm a oportunidade de fazer a diferença.

By the way

Em qualquer aventura, o que importa é partir, não é chegar. (MT)

27 de agosto de 2009

Momento...

momento saramago




















José Saramago e a esposa Pilar del Rio numa pausa em Madrid, onde o Nobel da Literatura português está a promover o seu novo livro, "Caim". A obra, que será lançada em Outubro, apresenta a tese de que não foi Caim o responsável pela morte de Abel mas sim Deus. Ainda este ano deverá chegar às salas de cinema o documentário “União Ibérica” de Miguel Gonçalves Mendes, que retrata a relação de Saramago e Pilar.

fonte: sapo.pt

13 de agosto de 2009

Hillary Clinton chega esta noite

Hillary Clinton





















O périplo de Hillary Clinton pelo Continente Africano domina a agenda internacional, e como Cabo Verde faz parte da lista dos países escolhidos, internamente o assunto vem merecendo muita atenção da Imprensa. A estadista americana vai aterrar poucos minutos depois das 20 horas desta Quinta-feira no Sal e permanece na Ilha até ao meio-dia de Sexta-feira. O Jornal da Noite na TCV, além de várias outras abordagens, decidiu ouvir os ex-diplomatas Humberto Bettencourt e José Luís Fernandes, (embaixador de Cabo Verde nos Estados Unidos entre 1980 e 1991).

Quisemos, à par das agendas do encontro, (a segurança, a boa governação, e a cooperação bilateral e multilateral) perceber os meandros das relações históricas entre os dois países.
Como Fernandes fez questão de realçar, não é a primeira vez que acontece um encontro de alto nível entre políticos dos dois países. Nos anos oitenta Bush pai visitara, a trabalho, Cabo Verde na qualidade de Vice-presidente dos Estados Unidos, e o primeiro Presidente de CV, Aristides Pereira, fora recebido por duas vezes pelo presidente americano Ronald Reagan. A agenda da época girava em torno da tensão na África Austral, envolvendo a Angola, tendo Cabo Verde desempenhado um papel importante.

O que vem à tona neste momento é o incremento das relações bilaterais entre os dois países, algo que remonta há vários séculos. Estas relações começaram com o comércio dos escravos, consolidaram-se com a emigração e consagraram-se com o sistemático apoio da América no processo de reconstrução do País, depois de 1975.

Nos primeiros anos da Independência, recorde-se, houve um clima de desconfiança dos Estados Unidos em relação a Cabo Verde, por questões ideológicas, (o PAIGC Soviético) mas a dúvida foi rapidamente dissipada, depois de uma missão diplomática cabo-verdiana nos Estados Unidos anunciando a decisão de não alinhamento em relação aos tensionamento da Guerra fria.
Com o tempo, por entre desconfianças e cenários vários, desenvolveu-se estima mútua entre Cabo Verde e a América reforçada com a presença da nossa comunidade naquele país, e mais tarde, nos anos 90, com a instalação e a consolidação da democracia

Nos últimos anos, com o tensionamento do narcotráfico na nossa sub-região, e tendo Cabo Verde se sobressaído, uma vez mais, como ponto de passagem (desta feita da droga), os EU voltaram à carga em nossa direcção, (depois de um abrandamento em meados de 90 das ajudas públicas ao desenvolvimento) com o programa Millenium Challenge Account, o troféu…

De resto, o prolongamento desse programa (da parte de CV), e a questão da Segurança (interesse americano) são os temas fulcrais da visita da estadista norte-americana, Hillary Clinton, a Cabo Verde.

12 de agosto de 2009

Mensagens provavelmente loiras

NO ESPELHO, Magrite




















1
Ardem-me os lábios
e é suave a sua loira ardência

Ardem-me os lábios
e é fugaz a sua loira ardência

Ardem-me os lábios
recostados à memória
e ao castanho ardor
do inferno dos dias

2
De ti beber a nudez
da púbis o seu espanto
dar - te a beber o leite
da condensação do desejo
os seus suplícios a nudez dos seios
os seus gemidos os seus suspiros

de ti beber a alucinação
do corpo a sua loucura
os seus gestos de intermitência

3
Digladiam-se enlouquecidos
os sentimentos indagam-se
devastados interpenetram-se
o amor a paixão a amizade
alucinados farol e tempestade
entreolham-se curiosos os sentimentos

4
O amor é uma chatice
uma âncora ilusória
que prende e retém a alma
prisioneira e fá-la
exaurir-se em cinza

Dizes o amor é um pântano
anula o mar da vida
entorpece os passos e outros sinais
encalhados doravante maculados na devastada
solidão que todavia intenta soerguer-se
do escasso fogo das faúlhas desfalecidas
em paixão reacendendo-se sobrevivas
ardentes crepitando redevivas
vívidas soletra o meu busto debruçado
sobre o frio perfil do silêncio
inconstante presságio do abismo
infalível habitáculo da dúvida

LX, Agosto de 2009
José Luís Hopffer C. Almada


magem: O Espelho, Magrite

11 de agosto de 2009

Poema Transitório

passeio

























(...) é preciso partir
é preciso chegar
é preciso partir é preciso chegar... Ah, como esta vida é urgente!

... no entanto
eu gostava mesmo era de partir...
e - até hoje - quando acaso embarco
para alguma parte
acomodo-me no meu lugar
fecho os olhos e sonho:
viajar, viajar
mas para parte nenhuma...
viajar indefinidamente...
como uma nave espacial perdida entre as estrelas.

Mário Quintana

10 de agosto de 2009

Laroyê!

mother white, Mário Cravo Neto




















Morreu, no Domingo, aos 62 anos um dos mais conceituados fotógrafos do Brasil, Mário Cravo Neto. O artista baiano, um dos precursores da arte conceptual em Salvador, ficará imortalizado como o artista/fotógrafo que melhor retratou a vida e a espiritualidade baiana, através das lentes. Além de uma longa lista de prémios, Cravo Neto, filho do escultor Mário Cravo Júnior, publicou diversos livros de fotografia.
Mário Cravo Neto é pai do também fotógrafo Christian Cravo, que por caminhos próprios tem seguido o ímpeto artístico do pai. Laroyê!

foto: mother white, Mário Cravo Neto

Na chuva com Nabokov

Pollock




















Parece-me que na escala das medidas universais há um ponto em que a imaginação e o conhecimento se cruzam, um ponto em que se atinge a diminuição das coisas grandes e o aumento das coisas pequenas: é o ponto da arte.

Vladimir Nabokov


7 de agosto de 2009

Do Cabo-verdiano: ao seu acanhamento e orgulho...

mayra






















De vez em quando ponho-me a analisar o comportamento do público cabo-verdiano diante do sucesso e do desempenho dos artistas. Confesso mesmo algum desconforto, principalmente quando os artistas vêm do Brasil onde os fãs são expansivos e demonstram todo o carinho que têm pelo músico ou pela banda. Dir-se-ia faltar a festividade do público mesmo em festivais! Em relação aos músicos nacionais, fico mais complacente porque sabem o público que têm, apesar de imaginar que gostariam de ser mais acarinhados.

Não que isso não aconteça, mas numa proporção muito abaixo do desejável. A apatia não pára por aí. Reparem, por exemplo, que não temos um único fã clube no país e os nossos músicos não são recebidos nos aeroportos, passando desapercebidos até perante a imprensa. Apesar da nossa propalada morabeza, não somos muito dados a emoções efusivas e intensas, e os nossos artistas ressentem isso de alguma forma. Mas com isso, não se pretende dizer que o nosso público não sabe apreciar. Longe disso: compram os discos, ouvem as músicas, apreciam os artistas muito no seu círculo de boca pequena, mas ficam inibidos na hora de demonstrar.

Por outro lado, confesso também estranhar a elevada comoção que o cabo-verdiano consegue demonstrar perante o falecimento de um artista, o mesmo artista que em vida mereceu, em algum momento da sua carreira, alguma indiferença. Um paradoxo!

Não terá chegado a hora de revermos esse lado, para no dia em que esses artistas nos deixarem (como aconteceu com Pantera, Ildo Lobo e agora Biús) se misturarem o seu sorriso aos nossos, como de resto, apregoa Ferreira Gullar, (um dos maiores poetas vivos em Língua Portuguesa)? Sempre que me coloco entre a vida e a morte me valem as palavras desse poeta brasileiro, vivo, e muito celebrado no seu país. Seguimos-lhes o exemplo?!

Orgulho (Mayra)

Ainda não ouvi Stória Stória, o último disco de Mayra Andrade (foto), como gostaria. Em casa de amigos e pelo rádio tenho escutado intermitentemente algumas das suas canções. Nada que não venha fazer por esses dias que se aproximam de Setembro (o mês dos meus encantos), e quando ela tem agendado cinco shows no país. Por ora, tenho sentido pela artista um fino orgulho crioulo quando a oiço, como ontem aconteceu, numa entrevista impecável que concedeu à RFI, em que falava do seu disco, da sua concepção de world music, do toque brasileiro do CD Stória Stória, do percurso da música cabo-verdiana vis-à-vis suas raízes tradicionais... Fino orgulho quando um amigo da Reuters em NY telefona-me a dizer que ficou muito bem impressionado com a dimensão dessa jovem artista cabo-verdiana de 24 anos que acabara de entrevistar. Orgulho grande com o disco de Ouro que Stória Stória acaba de arrebatar em Portugal.

bom fim-de-semana

6 de agosto de 2009

Acontece

belle




















Bateram à minha porta em 6 de agosto,
aí não havia ninguém
e ninguém entrou, sentou-se numa cadeira
e transcorreu comigo, ninguém.

Nunca me esquecerei daquela ausência
que entrava como Pedro por sua causa
e me satisfazia com o não ser,
com um vazio aberto a tudo.

Ninguém me interrogou sem dizer nada
e contestei sem ver e sem falar.

Que entrevista espaçosa e especial!

Pablo Neruda (Últimos Poemas)

5 de agosto de 2009

Biús


















os mortos vêem o mundo
pelos olhos dos vivos

eventualmente ouvem,
com nossos ouvidos,
certas sinfonias
algum bater de portas,
ventanias

Ausentes
de corpo e alma
misturam o seu ao nosso riso
se de fato
quando vivos
acharam a mesma graça

Os mortos, de Gullar

Ver de novo ...















Dia: Hoje, Quarta-feira
Horário: 22: 30

Canal: TCV

4 de agosto de 2009

O tempo... o mar

sense




















Ando muito sensível e meio desarmada com as coisas ao meu redor. E ontem no lançamento de “Na Esquina do Tempo, Crónicas de Diazá” do Antropólogo Manuel Brito Semedo, o momento foi de especial emoção. O gesto de Brito Semedo “mexeu” comigo e confesso que estes rabiscos serão tudo o que quiserem, menos uma resenha de leitura resultante de uma interpretação rigorosa e objectiva.
Brito Semedo nessa obra mostra-se como um cronista de vidas passadas e de histórias do seu quotidiano homenageando a sua avó, Mãe Liza, a mãe e a filha. Três gerações de mulheres que ajudaram a moldar a sua personalidade, como, aliás, confessa. Mas também a escrita é de lembranças dos lugares e das situações memoráveis vividas com colegas de jornada. A descoberta do cinema (ou será a sua capacidade de transposição?), os marcos convencionais como festas de aniversário e de formatura (numa dialogia entre a ausência e a presença, mais tarde) também atravessam os textos.

Antes de ler tais crónicas, quis saber se as histórias eram tristes, alegres ou, finalmente, um misto disso tudo. Brito Semedo, sem hesitar, respondeu: “São tristes... foi uma catarse que decidi fazer com a minha vida”.

A dependência (emocional, inclusive) da avó, as dificuldades, os sonhos escondidos, a relação de desamor com o pai, tudo surpreende pela sua dimensão existencial. “Crónicas de Diazá” conta-nos a história de um ser humano que soube reconhecer o valor que outras pessoas tiveram no seu crescimento e na estruturação da sua personalidade. Desde a avó aos amigos,, passando pela primeira esposa e filhos... o homem atravessa o tempo com as suas mágoas, sem se deixar amargar. O ser humano que hoje decide compartilhar (com afecto, diga-se) as facetas que o fizeram.

Em nota: Todos os lucros do livro revertem-se a favor da Associação de Luta contra o Cancro.

O mar

Foi assim, como ver o mar, a primeira vez que os meus olhos viram o seu olhar...

3 de agosto de 2009

Finale














Cansei-me um dia dos horizontes fechados
e num desafio aos deuses
lancei meus versos ao mar
Limpo como o dia
Caminhei triste pela praia
O que atrás ficou não eram só os momentos
vagos que um dia deixei de viver
Afinal, somado, tudo aquilo
- os poemas, o mar, o dia claro –
nada é verdadeiro, nada é ilusório
tudo é quase nada, nada é quase tudo

josé vicente lopes

in: destino di bai