27 de abril de 2007

Esperemos

Há momentos sem sentido que fazem todo o sentido. Nessas horas, leio o meu outro poeta:
Há OUTROS DIAS que não têm chegado ainda,
que estão fazendo-se
como o pão ou as cadeiras ou o produto
das farmácias e das oficinas
- há fábricas de dias que virão

Pablo Neruda

25 de abril de 2007

De tudo

Não falo dos versos... só depois... depois de tudo.

Blog

Nos últimos dias andei um pouco distante da net por razões várias. Para começar, a conexão está lentíssima em Cabo Verde por causa do corte do tal cabo. À par disso, outros afazeres têem-me consumido energias saudáveis de que preciso para aqui estar por inteira. Nessa distância veio-me à lembrança as trocas de ideias muito participadas que aconteceram por uns bons tempos entre blogueiros, principalmente os de cá. Alguns anónimos, outros não, o famoso Pasqualino Settebellezze (de quem confesso saudades), e muitos outros. Este meu desabafo pode ser entendido como um convite à retoma da partilha e à troca saudável de ideias (dissonantes, porque não!?). Se criamos um blog é porque nos motiva, nos dá gozo e temos algo a dizer.

Eco

Porque o silêncio e a calma das horas solitárias
da noute sem vento e do mar sem ondas
como que fazem despertar
no fundo do meu ser
o eco silencioso
de vozes suspensas
e de aflicões esquecidas

Jorge Barbosa

12 de abril de 2007

Desolação


Em Outubro do ano passado conheci a italiana Laura Spronacci e encantou-me a sua paixão por Cabo Verde. Era uma jornalista com longa experiência na área desportiva, e fez toda a sua carreira na televisão. Enquanto tal vinha com frequência a Cabo Verde.
Dizia que a sua paixão por estas ilhas nasceu num primeiro olhar. Depois de reformada fez as suas malas e veio.

Conheci-a numa festa na sua Gruta - um empreendimento ousado e funcional erguido na Cidade Velha. Depois desse dia escrevi este post. Não quis acreditar quando li aqui a notícia da sua morte. Hoje, recebo um comentário de Kidjak a querer esclarecer a dúvida. É sim, trata-se da mesma pessoa: Laura Spronacci. Que a sua alma descanse em paz. Mais não digo...

11 de abril de 2007

Reminiscências


foto daqui
Choca-me a notícia da chegada de mais uma embarcação clandestina às ilhas Canárias, cheia de africanos, inclusive mulheres e crianças. Esse facto faz-me lembrar a escravatura. A empreitada mais desumana que o mundo já assistiu, e que deveria ser considerada a maior vergonha mundial de todos os tempos.
Ainda hoje, esses barcos negreiros continuam a circular. Os seus capitães e passageiros são interceptados em alto mar. Tal gente nem chega a conquistar o que há cinco séculos foi possível: um porto.
Há coisas que chocam. Parafraseado uma ilustre caseira, “preciso descobrir o que me liga à escravatura”.

A ilha

Aproxima-se mais um 1º de Maio, data, para mim, mais do que dia dos trabalhadores, mas do padroeiro da cidade que me viu nascer. Assistir à missa e à corrida de cavalos eram as únicas actividades que, enquanto criança, estavam ao meu alcance. Lembro-me da festa que era a chegada de gente da Praia, e principalmente dos grupos musicais, ora Gama 80, ora Bulimundo, ora Finaçon.
Outra novidade eram os famosos “carros gaiola” para prender “piratas” que chegavam da Praia, acompanhados de reforço policial. A chegada dos cavalos, principalmente de Santo Antão e S.Vicente, igualmente fazia parte da movimentação de San Filipe. A dinâmica das barracas nas feiras era diferente, mais saudável e mais festiva. Lembro-me de padres a venderem nas barracas das Cáritas. Hoje, não consigo imaginar um padre nos bailes do Presídio.
A idade não me permite muitas ginásticas remanescentes, mas lembro-me do almoço no Instituto da Solidariedade e da movimentação, verdadeiramente popular, que ali se dava.
Depois de 91, tudo mudou. Pela primeira vez, nesse ano, dois grupos musicais se deslocaram ao Fogo e num acto insólito aconteceram duas feiras - uma do MPD na praça do Presídio e outra do PAICV no Instituto. Era o que se dizia à boca pequena e o alinhamento dos militantes e simpatizantes veio a comprovar isso.
Nos anos seguintes, as feiras duplas não se repetiram, mas nada ficou como dantes. Estranhamente, as conhecidas vozes do Movimento para a Democracia na Ilha, deixaram de participar nas Festas de S.Filipe. Depois de alguns anos de ausência, passei a frequentar com alguma assiduidade à Bandeira, e constactei a continuada descaracterização. Reparei também que são poucos os residentes que participam no almoço do grande dia, uma festa só para convidados. A bandeira de S.Filipe nasceu numa sociedade escravocrata e fortemente desigual. Factos que não podem ser perpetuados, em nome da tradição. Ninguém deve sentir-se dono da Bandeira de S.Filipe, e nem à margem dessa festa que é de todos nós.
1º de Maio é uma data que interpela a todos os filhos do Fogo. E, por arrastamento, a todos os cabo-verdianos.