10 de fevereiro de 2009

Serviço público: da repetição à verdade

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Há cerca de dois anos, um autarca dissera, pela comunicação social, que os jornalistas tinham por dever ajudar os políticos a governarem. Imaginei que na semana seguinte surgiriam artigos e mais artigos a desancarem no edil desabrido, mas nada aconteceu. O que se lê regularmente são artigos de opinião criticando uma ou outra peça emitida pela rádio e TV públicas, mas nunca uma análise de fundo e honesta a debruçar sobre a rede que emaranha esses mesmos órgãos, onde as falhas são culpa e responsabilidade de ninguém. Ou de todos, o que dá no mesmo.

O que se percebe nas entrelinhas de tais artigos é uma acusação directa ao desempenho dos profissionais, (somos considerados todos uns incompetentes) até porque esses articulistas são, na sua maioria, aspirantes a políticos, quando não ex-políticos, da situação e/ou da oposição. Esses mesmos que, quando governam, “governamentalizam” os órgãos públicos.

Essa viciosa relação (que mata o brio profissional e atrapalha as regras do jogo) não se restringe à política. Também as várias associações (que deveriam serenamente fazer o seu trabalho) justificam os fundos instrumentalizando os órgãos públicos. São os institutos que lançam projectos e programas (alguns que nem chegam a ganhar corpo) e que entram em parafuso se os seus actos não são noticiados. Para além das muitas agendas do executivo, do legislativo, do judicial e até do religioso (tidas como de interesse público) que são drenadas para a imprensa de forma acrítica e descriteriosa. Estes mesmos que se queixam da falta de investigação, quando na verdade não são receptivos às agendas dos órgãos da imprensa.

A verdade da repetição

Há poucos dias, li um artigo sobre outro assunto e retive a seguinte frase: “o perigo de uma ideia, (diria acto, aqui) repetida até à exaustão, é ela acreditar-se verdadeira” (isto é, tornar-se um hábito). Esse “hábito instalado” e insidioso que domina/desvia as atenções emerge como um dos maiores “problemas” dos órgãos públicos em Cabo Verde. As agendas não são consensuais entre os profissionais (horizontal e verticalmente); as redacções são atrapalhadas (e quem de direito não as endireita) absolutamente propícias aos atropelos das regras do jogo.

E quem deve agir?

Os equívocos perante o binómio Estado/Governo não existem apenas em Cabo Verde. Para regular e estabelecer parâmetros sobre tais equívocos existem, (ou devem existir) (e quando os há, deles se espera actuação), no caso da Comunicação Social, as Altas Autoridades, os Conselhos, as Associações de Classe, e, em algumas realidades, os Observatórios de Imprensa e os Ombudsman (Provedores dos Leitores, juntos aos órgãos). Sem uma “regulação” (não confundir com “instrumentalização”), e nesse “emaranhar das regras do jogo”, muito pouco se pode fazer.

Uma Nota

Paulo Markun, jornalista, actualmente Presidente/Director da TV Cultura (Órgão público do Estado de São Paulo) vai falar sobre o Serviço Público de Televisão na Reitoria da Universidade de CV. A conferência acontece no dia 12/2, pelas 18 horas.

3 comentários:

Edy disse...

Muito boa critica às criticas "ocas"...devias,ou melhor,ficas a dever aos teus leitores um desenvolvimento mais pormenorizado do 1 e 2ª ponto deste post...

Anónimo disse...

Olá!

Acho que, fundamentalmente, os partidos têm que sair das redacções dos media.

É vergonhoso. E ainda se gabam de "termos uma democracia exemplar..."

Basta!

Fonseca Soares disse...

Inteiramente de acordo MF. As possíveis soluções (tentativas de melhoria) eram para 'ontem'... mas parece que o 'hoje' ainda não chegou. E a culpa é mesmo de todos, enquanto os 'hábitos se cristalizam' (tornando-se verdades) e impedem a caminhada. Revolução na àrea precisa-se! Mas, ela só seria possível... com a vontade e o empenho de todos (a classe+todos os outros sectores desta sociedade cabo-verdiana). A esperança - que é a última a morrer... 'amarelou'. Sonho que um dia...