20 de outubro de 2008

Gil desafia a banda

Gilberto Gil
















Um disco sem banda, sem cor, sem limites. São os termos que descrevem Banda larga cordel, o último trabalho do músico brasileiro Gilberto Gil. Em síntese, Gil celebra, encerra, congrega, desconstrói, aproxima mundos, pessoas, ritmos, culturas, sexos. Mas alguém dirá certamente que essa é a marca do baiano mais famoso do mundo. Sim, é. Mas desta vez, Gilberto Gil relativiza ao extremo, esbarra fronteiras, aproxima tudo: está à frente do seu tempo quando canta os novos dilemas da civilização. Os pais estão preocupados demais/com medo que os seus filhos caiam nas mãos dos narcomarginais/ou então nas mãos dos molestadores sexuais/e no entanto ao mesmo tempo são a favor das liberdades actuais ...
As fragmentações, e reformulações de Gil se dão ao nível das letras, e através de uma profunda provocação rítmica que desafia toda e qualquer linearidade. Sente-se isso num arranque manhoso que oscila entre o forró e o reggae, para se entrar num frevo, num baião; de um samba canção, passando por um clássico, para um Sambalanço, de uma bossa para uma balada sambada: não tenho medo da morte, mas sim de morrer/ a morte é depois de mim/ mas quem vai morrer sou eu…
Linha contínua, Gil canta La renaissance africaine en francês num som electrónico: um ritmo open que se pode ouvir sem grandes analogias em qualquer banda do mundo. en europe, en amerique/ c'est toujour l'esprit d'afrique/la nouveauté qui prospère. Evoca sa mitologie, sa vie... Depois presta a grande homenagem à banda larga, "que tem o mundo todo na ampla discussão". Na faixa que dá nome ao disco faz profecias sobre a nova “infovia” que também se transformou em máquina de ritmos, questiona a autoralidade artística com a debandada da internet, e brinca com a própria voz que é sintetizada no final da canção: no futuro você vai poder tocar o meu samba sem querer/programação de sons seqüenciais/milhões de escolas de samba virtuais e virtuosos de versões sem fim.
Quem aprecia e crê na música de Gilberto Gil, para além do ritmo e do dito, deve ouvir Banda Larga cordel e sentir o cheiro tonal e pessoal do futuro da música, da arte, da África, do Brasil. Sua evocação à música, aos seus mestres (Baden Powell, Vinícius de Moraes…) e à miscigenação do universo que, para o seu legítimo íntimo, se centra no Brasil, onde nasce o ser do amor... Um disco imperdível!

2 comentários:

Anónimo disse...

Excelente post. A resenha crítica da Arte emerge aqui em toda a sua excelência. Gil é de facto uma "estrela guia" no firmamento da música.

Filinto Elísio

Anónimo disse...

A "estrela guia" que dita todas as nuances do firmamento... (o além da música): a tal correlação necessária. Mercy!

Margarida