30 de janeiro de 2009
Para ti, Selma...
Sobre a neve fria e dura vi diluir-se o teu sangue
Esta distância tamanha com o mar de permeio que subitamente se tornou perene
Longe o som da tua voz, o brilho do teu sorriso, interrompida a tua vontade de viver
Mas este teu/nosso banco de pedra onde me sento desconsolado e sem voz
Aguarda, ainda, à porta da tua casa o teu impossível regresso…
Fausto do Rosário, S.Filipe, Fogo
Esperemos
Há outros dias que não têm chegado ainda,
que estão fazendo-se
como o pão ou as cadeiras ou o produto
das farmácias ou das oficinas
- há fábricas de dias que virão -
existem artesãos da alma
que levantam e pesam e preparam
certos dias amargos ou preciosos
que de repente chegam à porta
para premiar-nos
com uma laranja
ou assassinar-nos de imediato.
nota pura: não necessariamente nesse derradeiro tom nerudiano, (também meu, por destino) desejo a todos um bom-fim-de-semana.
26 de janeiro de 2009
Pontos nos ii...
Porque se teima em reduzir o poder à esfera política? Eis a emblemática pergunta (a resposta a mim, me cala profundamente) de Inocência Mata, em resposta ao texto de Mia Couto (E se Obama fosse africano?). Tendo discordado em essência do texto do renomado escritor africano, retomo (daqui) o artigo de Inocência Mata, quanto a mim, muito esclarecedor (sublinhados meus). pura eu
“[...] encaminhava-se oportunamente para a relativização do que representa, nos Estados Unidos, a eleição de um presidente negro quando, como lembrou o próprio no seu discurso de tomada de posse, há menos de 50 anos, o seu pai não seria servido num qualquer bar – apenas por ser negro. Subjacente está o estafado discurso do mérito, como se o mérito fosse um absoluto sem laços nenhuns com a realidade, funcionando, deste modo como noção que busca desqualificar as desigualdades, as assimetrias e as discriminações, e acabando por concorrer para a naturalização de uma situação de desequilíbrio sem qualquer questionamento sobre a condição subalterna dos sujeitos que fazem parte do segmento não representado nas instâncias de poder, em todos os seus circuitos: social, económico, etnocultural, racial.
Relacionada com esta questão está uma possível discriminação de Barack Obama caso ele fosse um candidato africano, como refere Mia Couto no seu tão celebrado artigo de opinião. Se muitos duvidam da possibilidade de um Obama africano por não ser negro talvez seja por não terem conhecimento do que vem acontecendo em África, nomeadamente com Jerry Rawlings, ex-presidente do Gana, filho de pai escocês; Seretse Khama Ian Khama, presidente do Botswana, filho de mãe inglesa; Fradique de Menezes, presidente de São Tomé e Príncipe, filho de pai português. Além de que, conviria não esquecer, o próprio não se consideraria negro – considerar-se-ia diferente e pertencente a «outro» grupo. Por isso, quanto a este aspecto mais facilmente haverá um Obama africano do que um Obama europeu (e escusado será dizer que provavelmente não haveria uma primeira-dama negra). Por outro lado, e como disse mais do que uma vez, podem ser traçados paralelismos entre a presença do negro na Europa e do branco em África. E se formos honestos, concordaremos quanto à muito maior visibilidade deste do que daquele. Assim sendo, porque será mais grave não haver um Obama africano do que não haver um Obama europeu? Além disso, olhando para os meandros do poder em muitos países africanos (sociais e culturais, quando não económicos e/ou militares), como falar de «marginalização e discriminação» de um segmento que, mesmo minoritário, se move no topo de uma pirâmide social?! Estranha discriminação! E sobre discriminação, acreditem, não sou apenas espectadora intelectual – sou catedrática!
O perigo de uma ideia repetida até à exaustão é ela começar a acreditar-se verdadeira. Por isso, convém relativizar a frase de Obama segundo a qual a sua história só ser possível na América. Em muita África tem sido possível: isto é, a presença de «outros» na ciranda dos muitos poderes (porque se teima em reduzir o poder à esfera política?). Convém que as convicções ideológicas não turvem a análise cultural e científica.”
Inocência Mata, Angolense 24 a 31 de Janeiro
Parabéns, Kesmyn
Kesmyn, filha de Kim Alves, a animar, ontem, a festa dos seus anos no Quintal da música. Só reforça o emblemático ditado "filho de peixe, peixinho é". A coordenação, a entoação, a atitude, tudo está lá. E se depender da intensidade parental, ( e das pegadas da família Alves), Kesmyn é já uma estrela. A mãe, Esmy, também vive nos palcos ao lado do pai. A princesa parece estar "encurralada" pela música.
23 de janeiro de 2009
Antes do amor
Antes de amar-te, amor, nada era meu
Vacilei pelas ruas e as coisas:
Nada contava nem tinha nome:
O mundo era do ar que esperava.
E conheci salões cinzentos,
Túneis habitados pela lua,
Hangares cruéis que se despediam,
Perguntas que insistiam na areia.
Tudo estava vazio, morto e mudo,
Caído, abandonado e decaído,
Tudo era inalienavelmente alheio,
Tudo era dos outros e de ninguém,
Até que tua beleza e tua pobreza
De dádivas encheram o outono
poema: Neruda
título: pura eu
foto: Jan Dirkx
Uma tragédia ...
Keith Luke, americano de 22 anos, (1ª foto) morava na Clinton St., em Brockton. Mudou-se para Pleasant Street, mas circulava de carro pela antiga rua, uma média de três vezes por dia, relata um homem dos seus trinta e poucos anos. Antes da mudança de casa, Keith era vizinho das duas irmãs cabo-verdianas, Selma Gonçalves de 19 anos (2ª foto) - e sua irmã de 21 anos. Na passada quarta-feira, confessou à polícia que seguiu no seu carro, munido de uma pistola 9 mm e muita munição com o propósito “de matar pretos e judeus”. Dirigiu-se à casa das duas irmãs, e segundo relatos do jornal Boston Herald, foi à procura de Selma, mas acabou sendo atendido pela irmã a quem violentou sexualmente.
Na tentativa de socorrer a irmã, Selma foi baleada mortalmente. Entre disparos e fugas, o alegado criminoso matou Arlindo Gonçalves (72), um cabo-verdiano sem tecto que deambulava pela rua. A irmã de Selma foi socorrida por um vizinho cabo-verdiano, encontra-se hospitalizada e o seu estado inspira cuidados.
As duas jovens nasceram e cresceram em S. Filipe, Ilha do Fogo, e emigraram para os Estados Unidos no ano passado.
Keith Luke chegou a contar o seu plano à polícia: depois de matar pretos (o maior número possível), pretendia dirigir-se à Sinagoga mais próxima (Beth Emunah), para liquidar judeus, e depois por fim à própria vida. Luke é tido como um indivíduo que fomenta o ódio racial e terá confessado a sua missão à polícia: “impedir a aniquilação dos brancos”.
O mesmo país que na terça-feira passada fez brilhar os olhos do mundo, 24 horas depois foi palco de um acto terrível que abalou a comunidade cabo-verdiana no estado de Massachusetts, e deixou uma ilha em peso de luto.
À família enlutada, gente próxima e amiga, deixamos aqui o nosso profundo pesar. Da comunidade cabo-verdiana em Massachusetts, espera-se que não se deixem “levar” por essa tragédia que deriva, pensamos, de um acto demente e incomum.
fotos: Boston Herald/Visaonews
Na tentativa de socorrer a irmã, Selma foi baleada mortalmente. Entre disparos e fugas, o alegado criminoso matou Arlindo Gonçalves (72), um cabo-verdiano sem tecto que deambulava pela rua. A irmã de Selma foi socorrida por um vizinho cabo-verdiano, encontra-se hospitalizada e o seu estado inspira cuidados.
As duas jovens nasceram e cresceram em S. Filipe, Ilha do Fogo, e emigraram para os Estados Unidos no ano passado.
Keith Luke chegou a contar o seu plano à polícia: depois de matar pretos (o maior número possível), pretendia dirigir-se à Sinagoga mais próxima (Beth Emunah), para liquidar judeus, e depois por fim à própria vida. Luke é tido como um indivíduo que fomenta o ódio racial e terá confessado a sua missão à polícia: “impedir a aniquilação dos brancos”.
O mesmo país que na terça-feira passada fez brilhar os olhos do mundo, 24 horas depois foi palco de um acto terrível que abalou a comunidade cabo-verdiana no estado de Massachusetts, e deixou uma ilha em peso de luto.
À família enlutada, gente próxima e amiga, deixamos aqui o nosso profundo pesar. Da comunidade cabo-verdiana em Massachusetts, espera-se que não se deixem “levar” por essa tragédia que deriva, pensamos, de um acto demente e incomum.
fotos: Boston Herald/Visaonews
22 de janeiro de 2009
Depois de tudo...
"Tout moment est dernier, parce qu’il est unique." Marguerite Yourcenar
Barack Hussein Obama é desde 20 de Janeiro (data hoje duplamente simbólica for us/me) o Presidente dos Estados Unidos da América, a nação mais poderosa do mundo, e eu que nada tenho a ver com a América, fiquei intensamente touché! Longe de equilibrar a América, pacificar as hostes, ajudar a África, ou prevenir contra uma possível recessão económica mundial, Obama, for me, significa vitória, compromisso, igualdade de oportunidades, e sobretudo atitude na vida.
E por falar em atitude, diria, em tempos de paz, que qualquer governo de Cabo Verde, no gozo da sua soberania conquistada, pode e deve emitir comunicados, apelando, ou posicionando-se (e não ordenando) contra invasões ou guerras, e fazer-se presente no plano internacional. À semelhança de outras soberanias, Cabo Verde também goza desse direito reconhecido pelas Nações Unidas.
16 de janeiro de 2009
Momentos
1.
Eis-me
face aos papéis
e estes me dizem:
é arriscado
ser-se indagador
Não porque
falassem os papéis
mas pela sua simples postura
branca sobre a rectangular nitidez
da secretária
É arriscado ser-se indagador
dizem os papéis
brancos na cava sonoridade
da sua postura
e são outras as vozes
que por entre eles ressoam
Talvez sejam as vozes
dos donos dos papéis
e dos fiscalizadores das receitas e despesas
do Orçamento Geral do Estado
2.
Por aqui estou
livre
porém preso
ao sol do meio-dia
Desapareceu a bruma seca
e sob a plena e ofuscante
claridade do dia
rutilam os casebres
nítidos e míseros
Vazia de água
leito dos restos do dia
a ribeira é uma viela ampla
por onde circulam os pedintes
ruela por onde deambulam
os cilícios da marginalidade
de mentes várias desempregadas
tela na qual se desenha
o arrojo arquitectónico
das crianças filhas da rua
e se configura a despojada engenharia
das suas brincadeiras semi-nuas
Por aqui estou
livre como a cidade
meditando porém
nessa liberdade
que me amordaça
os resquícios de ousadia
e me prende
como aos outros
que se não calam
aos papéis vazios
à secretaria vazia
à minha condenação
à impotência e resignação
por demasiado amor à liberdade…
poema: José Luís Hopffer C. Almada
15 de janeiro de 2009
Da toponímia
A toponímia da Cidade da Praia, mais do que em outros pontos do país, sempre esteve à mercê das oscilações políticas e de grupos, e envolta a alguma vulnerabilidade. Haviam os nomes atribuidos pelo regime colonial que, depois de 1975 com a Independência Nacional, foram substituidos por outros, e com o advento da democracia alguns foram retomados. A estátua de Diogo Gomes “na testa” do Plateau é um exemplo emblemático. Outro caso curioso, foi o Bairro Craveiro Lopes que logo depois da Independência passou a apelidar-se de Bairro Kwame n´kruma para depois com a democratização recuperar novamente o topónimo Craveiro Lopes.
A atribuição de nomes a ruas, praças e estátuas, independentemente das vontades partidárias, políticas, ou de grupo é uma questão sensível e deve sempre partir de argumentos claros e consensuais de ordem histórica, geográfica, cultural ou mesmo simbólica. O que ocorreu há dias com o nome Largo Eusébio, atribuído pela Câmara Municipal da Praia à conhecida Rua Capela, em Achada Santo António, destoa dessas premissas.
O Edil praiense reagiu na comunicação social à “ligeira” manifestação de alguns moradores da zona e disse tratarem-se de pessoas bem identificadas, afiançando que 99,9 % dos moradores estão de acordo com a decisão camarária. Faltou apresentar argumentos quanto "à legitimidade" do acto. De referir, que a dita rua é já uma marca: Rua Capela: uma capela que serve o grosso dos fiéis do bairro, construída por um morador antigo e bem conhecido de todos, e mais; uma rua, em cuja terra batida terão brincado muitos Eusébios nossos. É que se não houver uma ligação directa chão/nome, mormente se tratando de um largo, o nome não será facilmente assumido pelas pessoas, independentemente das qualidade da figura.
Esta nota não desmerece a figura do Pantera Negra, e nem se pretende representativa, apenas reflecte alguma estranheza perante essa ligeireza da edilidade, numa tentativa quiça, imbuída de boa fé, de agradar a estrela do Benfica. Entretanto, acreditamos, que possa existir alguma outra rua da Cidade que, eventualmente, despoletasse uma ligação mais afectiva (e menos confusa) com a lendária figura.
12 de janeiro de 2009
Intermezzo (na tela e nas coisas)
1. Prison Break de Paul Scheuring, pela adrenalina e pela actuação pavoneada e silenciosa de Scofield (Wentworth Miller) - foto.
2. Sete Palmos de Terra, a maior criação de Alan Ball, com os textos mais ousados vistos na TV. Uma explosão cruzada de sentidos; onde o sexo surge como imanente e revitalizador; momentus em que o ser humano se despe dos seus preconceitos e das convenções; um recorte que elege a loucura como um dos sensos mais lúcidos e elevados quando a escolha se centra entre a luz da vida e o silêncio da morte; A própria morte se impõe como uma página da vida.
3. As coisas são como são, já dizia Arménio Vieira.
9 de janeiro de 2009
Saudade
Saudade é solidão acompanhada,
é quando o amor ainda não foi embora,
mas o amado já...
Saudade é amar um passado que ainda não passou,
é recusar um presente que nos machuca,
é não ver o futuro que nos convida...
Saudade é sentir que existe o que não existe mais...
Saudade é o inferno dos que perderam,
é a dor dos que ficaram para trás,
é o gosto de morte na boca dos que continuam...
Só uma pessoa no mundo deseja sentir saudade:
aquela que nunca amou.
E esse é o maior dos sofrimentos:
não ter por quem sentir saudades,
passar pela vida e não viver.
O maior dos sofrimentos é nunca ter sofrido.
Pablo Neruda
8 de janeiro de 2009
Rede Record: da desgraça à redenção
1. Muitos já devem ter reparado no tom incisivo da grelha de programação da TV Record, canal brasileiro emitido em sinal aberto em Cabo Verde. Record é uma rede de televisão brasileira, cujos donos pertencem ao influente “bispado” da Igreja Universal do Reino de Deus (IURD). A rede (TV e rádio) é de cariz nacional e se ramifica através de dezenas de TV´s filiais estaduais e centenas de rádios pelo Brasil, e pelo mundo, (em alguns países africanos, inclusive). A tendência recente tem sido a igreja arrastar consigo o canal, e em outros têm acontecido o inverso; lá onde for permitido (como aconteceu em Cabo Verde) a regra é estarem juntos.
A Informação (o jornalismo) da Record, com a atractiva máquina de produção que em muitos casos ofusca o conteúdo, é marcadamente sensacionalista. O entretenimento cumpre e bem o seu papel “entreter”. Os documentários, alguns sobre os recônditos do Brasil, e outros sobre países e culturas estrangeiras, são bons.
A nossa atenção vai para o jogo dialéctico entre o paraíso e o inferno que perpassa o grosso da produção da record: da informação à teledramaturgia, e isso leva-nos a perceber a incessante ligação existente entre os dois ramos empresariais mais expressivos desses senhores: a televisão e a igreja.
O canal faz um esforço de priorização desmedido no sentido de configurar um “Brasil real” terrível. Basta assistir aos serviços informativos da Estação e perceber o número e a repetição de crimes transmitidos, e notar como a hipótese do agenda setting é trabalhada. Como se sabe, a realidade social, os temas de conversa, os assuntos de actualidade são montados, nos dias que correm, pelos media. Quando a sociedade é sufocada por situações limites, a saída está na busca pela redenção, na fé, num Ente superior…
O mesmo acontece com as telenovelas produzidas pelo canal: a intenção inequívoca de chocar, a luta entre o bem e o mal conhece e ultrapassa todos os seus limites (vide Mutantes); os extremos, a miséria humana, a decadência e o fosso sociais são condições sempre colocadas perante uma luz redentora e a possibilidade de regeneração.
O destrono de Júpiter, ou se quiserem, a luz no fundo do túnel, estará na mensagem que apregoa a Igreja Universal do reino de Deus, lá no finalzinho da emissão, depois de tudo…é assim em todos os lugares do mapa por onde pisa o canal “redentor”.
Os factos
2. À par dessa leitura primeira que incomoda pouquíssima gente, é justo dizer que a Record é o canal que mais cresceu no Brasil, tendo se beirado (não sei se ultrapassado) à poderosa Rede Globo em alguns picos de audiência O canal multiplica todos os dias contratos com jornalistas, apresentadores e actores de renome (muitos ex-globais).
O nível de produção em quantidade e qualidade tem aumentado, e traduz-se nos números de telenovelas e séries, coisa que a Record não fazia há 10 anos.
Levando a bandeira da fé como cartaz, a Record lança, em força, os seus tentáculos para fora do Brasil. Uma atitude que tem motivado a que outros canais do Brasil se interessem por uma maior penetração no mercado internacional.
Ineditismo
3. Independentemente de qualquer juízo que possa ser feito sobre a programação da Record, (que fosse pelo brilhantismo) é importante lembrar que a emissão desse canal em sinal aberto em Cabo Verde (com programação nacional ínfima) é provavelmente um caso inédito no mundo.
5 de janeiro de 2009
Da imagem à liderança política
Os presidentes do PAICV e do MPD transmitiram, no dia 31 de Dezembro do ano findo na Televisão de Cabo Verde, os votos de bom ano novo aos cabo-verdianos, no âmbito do tempo de antena que os dois partidos gozam na estação de televisão pública. Essas comunicações suscitam algumas leituras à semântica dos seus conteúdos.
O teor e o tom são antagónicos, como se sabe. Para o MPD, o país, não fosse o razoável ano agrícola, estaria numa profunda agonia. Segundo Jorge Santos, tudo vai muito mal, e o governo perdeu, a crer nas suas palavras, o controle da situação. O Presidente do PAICV apresenta a sua versão; um país que caminha, com projectos, com avanços: novas bacias hidrográficas, melhor aproveitamento dos parques naturais, boa governação, casa do cidadão, etc.
Mas não apenas o conteúdo dessas duas comunicações eram diferentes, a forma como foram feitas também, daí o motivo deste post. A televisão é um médium de imagem por excelência e para se atingir determinados objectivos em muitas conjunturas não podemos dela descurar: ela mostra e convence. Não basta dizer que o país caminha a várias velocidades, ainda que possa ser a mais crua realidade, é preciso mostrá-lo, pouco adianta ater-se ao (des) ânimo dos cabo-verdianos, esta é uma tarefa do operador de imagem: focá-lo.
O tempo de antena do MPD se resumiu ao comunicado de Jorge Santos, que foi “para o ar” sem o genérico ventoinha; o do PAICV foi um "filme" iniciado por um genérico novo, música de fundo emblemática (Nós Cabo Verde di speransa de Norberto Tavares), imagens do país in complemento do texto off em crioulo, (a narração é impessoal, e por isso mesmo de todos) e com entradas curtas do presidente do partido. Nessas aparições, José Maria Neves priorizou as realizações do governo e discorreu de modo directo sobre as perspectivas do seu partido. De lembrar que a produção dos tempos de antena é da responsabilidade dos partidos políticos.
O MPD, sem intenção de ajuizar sobre o teor da sua comunicação, não adequou o conteúdo ao meio, e isso enfraqueceu a sua mensagem. Bastava trabalhar com antecedência; ir ao terreno. O PAICV, por seu turno, (por ter respeitado a gramática do meio) conseguiu, com melhor eficácia, passar a sua mensagem.
Numa leitura semiótica se pode dizer ainda que Jorge Santos (da forma como se dirigiu aos cabo-verdianos) tenha atraído a si (e só a si) a ventura (e a desventura, se for o caso) do seu partido, nessa sua busca visível por uma liderança sem contestação. José Maria Neves, não se colocando nesse patamar, já que exerce o papel de primeiro ministro, está menos ansioso, deixando algumas (senão muitas) glórias para o partido. Dirigiu-se aos cabo-verdianos como líder e parte de um todo, respeitando toda a dinâmica das representações “dessa realidade”.
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