Carlos Matos |
“Os momentos” conversou com o pianista e professor de música Carlos Matos via facebook. Ele, na sua residência na Holanda, e nós, por cá, algures, no arquipélago.
Aos 5 anos, quando acompanhado da mãe foi assistir a um show do grupo Voz de Cabo Verde, soube que rumo dar à sua vida. Queria ser músico e um homem do piano. Começou a estudar música aos 9 anos. Fez conservatória, basicamente para música clássica, mas veio despertar-se para a música cabo-verdiana bem depois, após um repto da própria conservatória. Do retorno às raízes, Matos leva a música cabo-verdiana à conservatória, e surge o primeiro projecto World Music Orchestra Codarts de que se torna maestro.
O músico que admite que na adolescência “não gostava da música de Cabo Verde”, descobriu depois um mundo de possibilidades rítmicas, estéticas e culturais. “Eu descobri que você pode desenvolver a música cabo-verdiana, em muitos aspectos”, diz. “Comecei, em 1995, com a minha primeira banda acústica Nostalgia onde aprendi o básico da música cabo-verdiana tradicional, e descobri as minhas raízes, não apenas como músico.” Em termos de banda, integrou ainda os Koladance e o emblemático grupo Rabelados. No seu percurso, além de vários artistas e bandas estrangeiros, Matos já acompanhou nomes nacionais como Luis Morais, Ildo Lobo, Titina, Boy Ge Mendes, Tito Paris e muitos outros.
Cabocubajazz, a Banda, o Disco
Em 2008, com o famoso percussionista alemão Nils Fischer, ele funda uma banda e agora veio o primeiro disco: Cabocubajazz - Rikeza e Valor. Pela plástica e pela gramática, sem perder-se das raízes todas, este disco materializa o pensamento musical de Matos. Ritmos juntos, cubanos e cabo-verdianos, todos crioulos; jazz é cabo-verdiano, mas é também cubano. As vozes também são partilhadas: Dina Medina, Grace Évora e o colombiano Alberto Caicedo. A banda também é uma amálgama de nacionalidades: Sérvia, Colómbia, Estados Unidos, Senegal, Alemanha, Curaçao e, claro, Cabo Verde.
A experimentação permanente que sela a carreira do pianista também está plasmada no seu primeiro disco, Caboverdianismo.
Formação musical
Carlos Matos, filho de pais cabo-verdianos, nasceu há 39 anos, e sempre viveu na Holanda. No próximo ano prepara-se para rumar às ilhas e ensinar música na Universidade de Cabo Verde. O Pianista tem um olhar muito preciso sobre a música cabo-verdiana. Entre nós, grava-se muito, mas não é o suficiente, entende.
“A chave do desenvolvimento da nossa música é a EDUCAÇÃO. Estamos conscientes de que a nossa música é reconhecida mundialmente por causa de Cesária Évora e outros, agora é a hora de preparar a nova geração com a nossa música tradicional. Organizar workshops, masterclasses com grandes guitarristas como Báu, Voginha, Kim Alves, Paulino Vieira, pianistas como Tututa, Chico Serra e Toy Vieira. Se não começarmos agora, dentro de 10 a 15 anos algum conhecimento desaparecerá.”
É nesse sentido que o pianista desenvolve um projecto de ensino para as crianças; a ideia é encontrar métodos adaptados para tocar a coladeira e a morna. “Como é que o povo japonês pode cantar jazz e fado? Porque existem livros e professores!” É o exemplo que nos deixa.
O Rumo, a estética
O pianista demonstra uma visão positiva sobre o rumo da música cabo-verdiana, mas também fala em alguma inquietação. “Estamos numa fase em que começamos a ser maduros nas escolhas artísticas, o que é bom. Não temos mais a necessidade de copiar o zouk, por exemplo, para torná-lo nosso. Gostaria que voltássemos mais às nossas raízes, para criar algo novo a partir daí. É como uma língua: se você quiser jogar com a gramática, você tem que conhecê- la bem, certo? Miles Davis disse uma vez: If you want to break the rules, you have to know them first!”
Carlos Matos tem em Luís Morais a imagem de uma figura paterna. “Ele incorpou a música cabo-verdiana”. O legendário instrumentista é primo de Carlos Matos, o nosso, hoje, homem do piano.