31 de maio de 2007
Tengo hambre de tu boca...
Tengo hambre de tu boca, de tu voz, de tu pelo
y por las calles voy sin nutrirme, callado,
no me sostiene el pan, el alba me desquicia,
busco el sonido líquido de tus pies en el día...
Neruda
30 de maio de 2007
Fogo - a ilha real
O Fogo é uma ilha estrategicamente próxima de Santiago. Outrora, a dois passos dos centros portuários de importação e exportação: Ribeira Grande e Vila da Praia. Não só proximidade, mas evidente acessibilidade. Esta é a razão – tão comparativa, quão competitiva – que leva os moradores de S.Tiago a terem tido preferência pelo Fogo, como segundo espaço de povoamento. Obviamente que uma carta-régia impeditiva aos moradores de S. Tiago motiva à procura do Fogo, como recurso essencial para se "lançar à Costa africana". Como diria o geógrafo José Maria Semedo, a Ilha do Vulcão é um desdobramento da matriz original de Santiago, e o que assimila à ilha mãe e à co-participação no tráfico negreiro. As ligações com o continente africano são vitais para o equilíbrio agro-produtivo da Ilha do Fogo, na medida em que determinaram a mão-de-obra escrava como o grande factor de produção.
Apesar desse cenário histórico, que é condição matricial da sociedade foguense, os incessantes relatos sobre o Fogo silenciam elegantemente a realidade outra de muita boa gente. Vejamos alguns exemplos, apenas:
Abílio Macedo escreve, nos anos sessenta, que a fidalguia de S.Filipe tem motivos para "se orgulhar de uma ascendência aristocrática, como a feição mais saliente e predominante dessa gente...".
Henrique Teixeira de Sousa escreveria, na Revista Claridade, que "quem ainda por 1910 visitasse a Ilha, nela encontraria na sua vila principal (S.Filipe) um aglomerado de muitas casas residenciais, na maioria primeiros andares erguidos no velho estilo colonial, amplos, avarandados, coberto com telha marselhesa. Nesses sobrados, segundo o escritor foguense, moravam as famílias brancas, descendentes dos antigos povoadores europeus.
Ondina Ferreira, mais recentemente, em 1997, escreve no jornal Terra Nova que "apelidos como Macedo, Henriques, Sacramento Monteiro, Barbosa, só para citar alguns, sugerem e recordam algumas famílias ilustres de sobrados que fizeram época, marcaram presença e distinguiram-se, alguns, não só como altos funcionários e dirigentes da ilha, do Arquipélago no período anterior à independência, como também funcionaram como referência nobilitantes da Ilha do Vulcão...".
Estas notas, diria, são a antítese das próximas histórias tristes que aqui vão ser lidas...quando aquele passado se me impuser!
Apesar desse cenário histórico, que é condição matricial da sociedade foguense, os incessantes relatos sobre o Fogo silenciam elegantemente a realidade outra de muita boa gente. Vejamos alguns exemplos, apenas:
Abílio Macedo escreve, nos anos sessenta, que a fidalguia de S.Filipe tem motivos para "se orgulhar de uma ascendência aristocrática, como a feição mais saliente e predominante dessa gente...".
Henrique Teixeira de Sousa escreveria, na Revista Claridade, que "quem ainda por 1910 visitasse a Ilha, nela encontraria na sua vila principal (S.Filipe) um aglomerado de muitas casas residenciais, na maioria primeiros andares erguidos no velho estilo colonial, amplos, avarandados, coberto com telha marselhesa. Nesses sobrados, segundo o escritor foguense, moravam as famílias brancas, descendentes dos antigos povoadores europeus.
Ondina Ferreira, mais recentemente, em 1997, escreve no jornal Terra Nova que "apelidos como Macedo, Henriques, Sacramento Monteiro, Barbosa, só para citar alguns, sugerem e recordam algumas famílias ilustres de sobrados que fizeram época, marcaram presença e distinguiram-se, alguns, não só como altos funcionários e dirigentes da ilha, do Arquipélago no período anterior à independência, como também funcionaram como referência nobilitantes da Ilha do Vulcão...".
Estas notas, diria, são a antítese das próximas histórias tristes que aqui vão ser lidas...quando aquele passado se me impuser!
29 de maio de 2007
O gato que Godim mandou
Los amantes fervorosos y los sabios austeros gustan por igual, en su madurez, de los gatos fuertes y dulces, orgullo de la casa, que como ellos son friolentos y como ellos sedentarios. amigos de la ciencia y de la voluptuosidad, buscan el silencio y el horror de las tinieblas; el Erebo se hubiera apoderado de ellos para sus correrías fúnebres, si hubieran podido ante la esclavitud inclinar su arrogancia. Adoptan al soñar las nobles actitudes de las grandes esfinges tendidas en el fondo de las soledades, que parecen dormirse en un sueño sin fin; sus grupas fecundas están llenas de chispas mágicas, y fragmentos de oro, cual arenas finas, chispean vagamente en sus místicas pupilas. (Los Gatos)
25 de maio de 2007
Histórias tristes (1)
Em Cabo-Verde fala-se muito na emigração para a América, mas existem poucos relatos pessoais capazes de ilustrar a fractura familiar e social que isso significou para a psique cabo-verdiana.
Pessoalmente, acompanhei, na minha infância, algumas estórias relacionadas a esse drama cabo-verdiano. Muitos familiares dos meus avós e bisavós saíram em vapores para a América e nunca mais voltaram para a sua ilha natal. Talvez por essa razão doa tanto lembrar o desaparecimento do barco Matilde, que, há meio século, partiu da Brava a caminho da América. Oitenta e tal pessoas morreram nessa tragédia. Um monumento que carrega o nome de todos os desaparecidos, na zona de Fajã d`água, na Brava, simboliza esse momento que tanto me intriga a alma.
A minha avó paterna não chegou a conhecer os pais, que embarcaram para a América, no início do século XX, deixando-a bebé na guarda de uma tia. Sempre me chocou o facto da minha avó ter perdido contacto com os pais. Ela dizia que destruía todas as cartas que recebia deles. Era a crença de que viriam mais e mais cartas…Certo dia, pararam as cartas e ela nunca soube dos pais, porque nunca guardara os envelopes que continham os endereços. Anos mais tarde, os seus filhos também foram para a América, mas não chegaram a encontrar os rastos dos avós, que, provavelmente, tiveram outros filhos nas terras do Tio Sam.
Lembro-me, com igual deslumbramento, da minha avó materna a contar, com eternidade no olhar, a saga de duas tias (irmãs da mãe) que, num rompante, chegaram em casa eufóricas e informaram que já tinham se alistado para ir para a América. Pegaram nos seus poucos pertences, puseram-nos num saco e embarcaram. Nunca mais regressaram. Sabe-se que com os anos e o surgir das gerações, mudaram o nosso apelido Andrade para Andrews. Ouvem-se histórias esparsas de um ou outro Andrews crioulo, mas é tudo…
Trarei, numa outra oportunidade, mais histórias tristes, das tantas que ouvi…
Pessoalmente, acompanhei, na minha infância, algumas estórias relacionadas a esse drama cabo-verdiano. Muitos familiares dos meus avós e bisavós saíram em vapores para a América e nunca mais voltaram para a sua ilha natal. Talvez por essa razão doa tanto lembrar o desaparecimento do barco Matilde, que, há meio século, partiu da Brava a caminho da América. Oitenta e tal pessoas morreram nessa tragédia. Um monumento que carrega o nome de todos os desaparecidos, na zona de Fajã d`água, na Brava, simboliza esse momento que tanto me intriga a alma.
A minha avó paterna não chegou a conhecer os pais, que embarcaram para a América, no início do século XX, deixando-a bebé na guarda de uma tia. Sempre me chocou o facto da minha avó ter perdido contacto com os pais. Ela dizia que destruía todas as cartas que recebia deles. Era a crença de que viriam mais e mais cartas…Certo dia, pararam as cartas e ela nunca soube dos pais, porque nunca guardara os envelopes que continham os endereços. Anos mais tarde, os seus filhos também foram para a América, mas não chegaram a encontrar os rastos dos avós, que, provavelmente, tiveram outros filhos nas terras do Tio Sam.
Lembro-me, com igual deslumbramento, da minha avó materna a contar, com eternidade no olhar, a saga de duas tias (irmãs da mãe) que, num rompante, chegaram em casa eufóricas e informaram que já tinham se alistado para ir para a América. Pegaram nos seus poucos pertences, puseram-nos num saco e embarcaram. Nunca mais regressaram. Sabe-se que com os anos e o surgir das gerações, mudaram o nosso apelido Andrade para Andrews. Ouvem-se histórias esparsas de um ou outro Andrews crioulo, mas é tudo…
Trarei, numa outra oportunidade, mais histórias tristes, das tantas que ouvi…
24 de maio de 2007
O crioulo, o jornalismo e o zouk
Receia-se dizer que a oficialização do Crioulo em Cabo Verde, nossa língua materna, é também ela, dentre várias outras questões, motivo de quezílias, principalmente políticas. Fico envergonhada quando percebo que um determinado individuo, ou personalidade, está à cata de argumentos para provar o quanto é inócuo oficializar a nossa língua, o corpus cultural que, em primeira e em última instância, melhor nos identifica.
O que se deve, e nunca é demais, é discutir os métodos do seu ensino e outros procedimentos, aliás muito avançados na sua formulação. Escrevo isso, a propósito de um texto caseiro que condena um alegado empurrão político do Primeiro-ministro para a concretização desse intento. Fiquei atónita! A oficialização do crioulo é uma questão política, sim senhor, e deveria ser uma bandeira de todos os partidos políticos, instituições, comunicação social, escolas, etc.
A oficialização da língua cabo-verdiana contribuiria, sim senhor, para o reforço da nossa identidade (isso é crime?), da nossa cidadania, da nossa centralidade global e da nossa humanidade. É uma questão até de direitos humanos, se se pensar em essência.
Economês versus jornalismo
Todas as quartas feiras à noite tenho um quebra-cabeças para resolver. Tentar digerir 10%, no mínimo, do conteúdo do programa Praça Financeira, da TCV. Cheguei a questionar a minha capacidade de processar números e confesso que me preocupei. Mas depois me abri com outras mentes, e apercebi-me que o problema é quase generalizado. O apresentador do programa, detentor de um MBA em economia, quando entra em delírio economês com os seus convidados se esquece de nós...os outros. É nisso que dá desprezar o jornalismo, desconhecer a palavra especialização e distrair-se diante do óbvio...
Nichols
Surgiu um tal de Nichols no mundo zouk em Cabo-Verde. Falta-me muita informação sobre ele. Sei apenas que ele vem muito à Praia, esteve no Gambôa e já fez dueto com uma crioula. Mas dá para concluir, de ouvido, que a sua música deveria ser proibida nas nossas rádios. Por uma questão de higiene mental...
23 de maio de 2007
Palavras
- Para eu dar a V. Ex.ª uma ideia do feitio desta senhora, basta dizer que depois do nascimento da Salu a gente deixou de tratar-se, e ela teve outro filho, apenas para me mostrar (pelo menos foi o que disse) que ainda era capaz de arranjar outro homem. Todo o seu mal vem deste maldito feitio – ela diz sempre que tem muito orgulho e é muito independente –, que a levou não só a brigar comigo mas até a não entregar Salu para eu a criar e educar. O resultado é que, para arrancar meios de vida, ela vê-se obrigada a alugar quartos a meretrizes e homens que desembarcam dos vapores.
Saltou-me à vista o trecho acima do conto Dona Mana de Baltazar Lopes. Faz-me bem pressentir (ou suspeitar), às vezes, (d) esse Cabo Verde passado. Uma necessidade existencial que extravasa o simples conhecimento.
Palavras que fazem tremer
…existem que eu sei.
21 de maio de 2007
Depois
O depois intriga pelo que não foi…
pela sensação,
pelo desejo,
e pela possibilidade (difusa)
de ser.
Jorge Barbosa
Rumores das coisas simples da minha terra...
Dos trapiches
Quando esmagam a cana para o grogue
Com os bois pacíficos a rodar,
Sempre a rodar
Ao som desse canto que vem dos currais
Numa cadencia estranha de nostalgia,
Que deixa um arrepio a morrer no ar...
Aparentemente de poética simplista, quase coloquial, Jorge Barbosa é o ápice da metáfora claridosa. Há mesmo quem afirme que a claridosidade apareceu ao grande público pelas mãos de Jorge Barbosa, quando, em 1935, ano anterior ao lançamento da Revista Claridade, publicou o livro “Arquipélago”.
Jaime de Figueiredo, antologista e dissidente do Movimento Claridoso, considerou Jorge Barbosa como uma presença poética das mais autênticas, integrada na realidade própria do movimento literário modernista dos anos 30. Os seus versos simples traduziam, no ver de Jaime de Figueiredo, a comovida identificação com a humilde matéria ambiente e os apagados dramas da vida das ilhas perdidas no mar.
O programa Claridade Incandescente mostra, amanhã, na TCV, “as máscaras poéticas de Jorge Barbosa”, com Manuel Veiga, Filinto Elísio e Zilda Barbosa (filha do poeta).
Dos trapiches
Quando esmagam a cana para o grogue
Com os bois pacíficos a rodar,
Sempre a rodar
Ao som desse canto que vem dos currais
Numa cadencia estranha de nostalgia,
Que deixa um arrepio a morrer no ar...
Aparentemente de poética simplista, quase coloquial, Jorge Barbosa é o ápice da metáfora claridosa. Há mesmo quem afirme que a claridosidade apareceu ao grande público pelas mãos de Jorge Barbosa, quando, em 1935, ano anterior ao lançamento da Revista Claridade, publicou o livro “Arquipélago”.
Jaime de Figueiredo, antologista e dissidente do Movimento Claridoso, considerou Jorge Barbosa como uma presença poética das mais autênticas, integrada na realidade própria do movimento literário modernista dos anos 30. Os seus versos simples traduziam, no ver de Jaime de Figueiredo, a comovida identificação com a humilde matéria ambiente e os apagados dramas da vida das ilhas perdidas no mar.
O programa Claridade Incandescente mostra, amanhã, na TCV, “as máscaras poéticas de Jorge Barbosa”, com Manuel Veiga, Filinto Elísio e Zilda Barbosa (filha do poeta).
18 de maio de 2007
O agora
Sei admitir as minhas esquisitices, e uma delas é a dificuldade que sinto em conviver com o agora. "Explico-me", com um exemplo:
A TCV está a preparar a emissão, em directo, do Gambôa 2007, e por causa disso, há uma semana que só oiço falar desse festival de música, a ponto de, sinceramente, não estar a pensar em assistir nem ao show do Beto Dias, nem da Sandra de Sá.
Em Salvador, também era assim. Mesmo morando a poucos metros da avenida Barra/Ondina (e convivendo com a zoada mediática) só colocava o pé fora de casa para ver o Araketu, o Expresso 2222, a partir do ano que retomou a avenida, e o Ilê Aiye.
Hoje, sinto saudades do Carnaval de Salvador, e quando lá vivia sonhava com o mês de Maio em Cabo-Verde.
Será este, talvez, devido à esquisitice de que vos dei conta, o meu único apontamento sobre o barulho que se instalou à nossa volta nesse aproximar do 19 de Maio, na Cidade da Praia. Festa do município, note-se.
I´m a blogger
Por um acaso encontrei neste site um debate interessante sobre um assunto que me persegue há já algum tempo. Qual deve ser a relação de um blogger com o seu sitio? As actualizações devem primar-se pela qualidade absoluta, ou esta deve ser mitigada com mais dinamismo, através de uma constante actualização?
Pode parecer uma preocupação pessoal de uns e outros, mas convém dizer que é um debate, hoje, académico.
Aliás, como diz, aqui, e muito bem, a Kamia, temos que começar a levar os blogs mais a sério entre nós. Como é que os nossos meios tradicionais e tímidos de comunicação lidam, ou não lidam, com a dinâmica dos blog´s? Quais os temas predominantes dos blog´s feitos sobre Cabo Verde? A quantidade de informação avançada pelos grãos de areia virtuais que somos, seguramente, ultrapassa, em proporção, a cobertura noticiosa dos nossos media. Isso, para mim, é um grande assunto.
17 de maio de 2007
Oh, Pamode?!
M´ obiba noba de nhá…
Que noba ê cumâ bento,
Que ta anda pâ tudo mundo
Sim parâ um só mómento…
M´ obiba noba tam sabe
Que m´cunçâ tâ crê nhá cheu…
Mâ nhâ era más frumós cara
Que Nhór Dês bota de céo!
M´temba, dixâ-m´ frâ nhâ craro,
Tanto gana conhê nhá
Que m´dijijâ mi era passo
Pa m´bemba na ar tâ boa
Jâ-m´olhâ gó m´ê bardade
Cusa, que és frâ, muto más!...
Oh Déos! Oh mundo! Oh pamode!
M´cal sérba inda rapaz?!
Que noba ê cumâ bento,
Que ta anda pâ tudo mundo
Sim parâ um só mómento…
M´ obiba noba tam sabe
Que m´cunçâ tâ crê nhá cheu…
Mâ nhâ era más frumós cara
Que Nhór Dês bota de céo!
M´temba, dixâ-m´ frâ nhâ craro,
Tanto gana conhê nhá
Que m´dijijâ mi era passo
Pa m´bemba na ar tâ boa
Jâ-m´olhâ gó m´ê bardade
Cusa, que és frâ, muto más!...
Oh Déos! Oh mundo! Oh pamode!
M´cal sérba inda rapaz?!
Pedro Cardoso... Folclore caboverdeano, 1933. In: No Reino de Caliban...
16 de maio de 2007
Ilha Nua
A blogosfera crioula ganhou mais uma ilha, acalentada por uma mão do além mar. O seu mentor é Jorge Marmelo, jornalista do Público, que depois de umas reportagens, nestas ilhas, ganhou mais um torrão. A um primeiro olhar jornalístico, seguiram-se algumas indagações históricas sobre a escravatura, feitas pelo jornalista a quando da rodagem do filme “A Ilha dos escravos”. Recentemente, mergulhou na ficção e recriou, num multiplicar de lugares, o Cabo Verde do seu íntimo. Falei com Jorge sobre essa nova ideia:
Jorge Marmelo, de há dois a esta parte, os teus trabalhos tem evidenciado um crescente interesse pela cultura cabo-verdiana. Porquê esse encanto?
Quando, há dois anos atrás, visitei Cabo Verde pela primeira vez, tive a sorte de ter conhecido logo três ilhas de uma assentada (Santiago, S. Vicente e Sal) e de me ter apercebido da riqueza e da diversidade de um país que, sendo territorialmente pequeno, tem uma dimensão imaterial enorme. Não creio que, com a excepção de Cuba, haja algum sítio comparável a Cabo Verde, capaz de, a partir de um território pequeno e de uma realidade demográfica reduzida, conseguir criar uma dimensão cultural tão forte. Isto por um lado. Mas o mais importante, creio, foi alguma coisa no modo como as pessoas me sorriram e receberam, amistosa e calidamente, o que me fez encontrar em Cabo-Verde uma espécie de segunda casa, um país ao qual, se pudesse escolher, eu gostava de pertencer.
Percebo, da nossa convivência, que o Ilha Nua é o início de algo mais. O quê, concretamente?
A ideia original que presidiu ao nascimento do Ilha Nua é a de criar uma publicação de actualidade cultural dos países que falam idiomas nascidos a partir da raiz comum do galaico-português, sem discutir sequer se esses idiomas constituem uma mesma língua ou línguas autónomas. A mim interessa-me que somos capazes, portugueses, brasileiros, angolanos, cabo-verdianos, galegos, moçambicanos, etc., de nos entendermos falando um idioma que, se não é o mesmo, é muito parecido. Isto devia ser o suficiente para que se estabelecesse uma comunidade, que, partilhando um veículo comum, partilharia também os bens culturais produzidos nesse idioma ou criados pela realidade imaterial desse idioma. Esta comunidade, porém, não existe, excepto, ocasionalmente, nos discursos doas políticos.
O Ilha Nua é, assim, uma espécie de casulo para a concretização daquela ideia original, a qual, a concretizar-se, espero que possa ser um pequeníssimo contributo para a concretização da tal comunidade lusófona.
Duas perguntas com respostas e um abraço ilhéu...
15 de maio de 2007
Sarará Criola
Uma voz quente
Uma artista versátil
Uma forte personalidade
Sandra de Sá entoa samba, blues ou jazz with equal intensity.
Actua este domingo no Festival de musica da Gamboa, na Cidade da Praia.
14 de maio de 2007
Ainda...
Começo de novo
Me lanço do zero
Percorro como que por inteiro
O incerto
Espero
Querer de novo
E quero
Ainda mais um pouco
Eu voo
Ainda sob o mesmo tecto
Ainda sobre aquele mesmo sonho.
Imagem:Femme Couchee, Picasso ... Letra: Ainda, Adriana Calcanhoto
12 de maio de 2007
E la nave va
Tatarana fica entre nós e "se crioliza" de vez com a Ilha nua. Pasqualino tem driblado os afazeres em Roma e dado as caras, com poesia à mistura. Albatroz remodela hermeticamente o blog, que brevemente completa mais um ano de vida. Kamia fez uma paragem, será da coceira nos dedos? Son di Santiagu prossegue com raça…O blog do Paulino recebe uma cartinha.
Ensaia-se uma ala marginal, inspirada no poeta Mário Fonseca. E la nave vá…cheia de poesia.
11 de maio de 2007
Conversa com o missionário
Aprecio o silêncio de certas ilhas, como de S.Nicolau e da Brava, e é precisamente nesses lugares onde, por razões pessoais, tenho tido maior contacto com a fé, particularmente com alguns padres.
O dedo de prosa que tive com o Padre Mauro, de 88 anos de idade, 45 em Cabo Verde, foi particularmente fascinante. Desta feita, fomos além do mero cumprimento e a nossa troca de ideias fez brilhar os olhos desse eterno habitante do Seminário-Liceu.
Um pouco da sua fascinante trajectória. Padre Mauro saiu da Itália numa missão dos Capuchinos para a Ilha do Fogo com apenas 30 anos, em Março de 1949. “Vim num barco mercantil e o meu primeiro contacto com Cabo Verde aconteceu em S.Vicente”. O cenário de desolação foi o primeiro choque, diz. Não saiu do barco, e na noite de 31 de Março seguiu para a Praia onde foi recebido pelo bispo hesperitano, D. Faustino Moreira dos Santos. Da Capital rumou para S.Filipe numa embarcação de nome Senhor das Areias, a 8 de Abril de 1949.
À chegada em S.Filipe estava a ser aguardado pelo padre Luis, que vivia nos Mosteiros. “Foi a primeira vez que andei numa mula”, conta. Foram dois dias de viagem, de S.Filipe para os Mosteiros.
Esse missionário lembra, com detalhes, a erupção vulcânica, ocorrida a 12 de Julho de 1951. O agente agrícola na Ilha, Sr. Leonel, o administrador, Sr. Luis Rendall, e os reverendos Piu e Luis foram as primeiras pessoas a prestarem socorro aos sinistrados de Chã das Caldeiras. Conta, em tom jocoso, a saga dos trabalhadores que tiveram de abrir a estrada depois da erupção e que, na hora da merenda, aqueciam a comida nas lavas.
Ah, antes que me esqueça! Ele remata também que, na época, só existiam três automóveis na Ilha do Fogo, e que nos Mosteiros, onde vivia, não chegou a ver carro algum. Havia um velho camião que pertencia a Sr. Augusto Vasconcelos, precisa.
Do Fogo, o Missionário viajou para a Ilha do Sal, onde chegou a celebrar o centenário da Nossa Sra da Piedade, em Santa Maria, com a saudosa presença do Sr. Bonafoux, o empresário da Salins du Cap-Vert. Essa capela, afirma, foi construída por um senhor conhecido por Duro. Permaneceu no Sal por 5 anos, num tempo em que as missas ainda eram rezadas em latim.
Esteve também na Boavista, por 4 anos.
Para S. Nicolau veio em dois tempos diferentes, perfazendo ao todo 23 anos, e é aqui, no silêncio da Vila Ribeira Brava, que pretende passar os restos dos seus dias.
Foi uma conversa onde se juntaram o passado e o presente. E as recordações fizeram-se naturalmente. “Gostava das pessoas. Tinham um respeito ilimitado para com os padres”, afirmou. “Havia uma radicalidade de fé no povo”.
Transcrevo estas linhas soltas, tal como saíram da boca do Missionário. Ele teve necessidade imperiosa de as contar. E eu um grande prazer de as escutar. Pairando nesse diálogo, o élan do silêncio de certas ilhas…
8 de maio de 2007
Parabéns Tatarana
Pelo número reduzido de blog´s cabo-verdianos, acabámos, juntos, por ser uma espécie de família em versão digital. Somos amigos, ou pelo menos ensaiamos simpatias, na Internet e fora dela. A esta, ainda pequena família, pertencem blog´s de outras paragens por sintonia programática e de estilo. E é por essa e outras razões que o Tatarana pode ser considerado um blog crioulo, e merecer o nosso olhar carinhoso. Além do blog, em si, há muito que Cabo Verde tem sido pano de fundo dos escritos de Jorge Marmelo (literários e jornalísticos). O seu último romance “Aonde o Vento me levar” é um exemplo.
Tatarana já passou por paragens, revoltas, indecisões e até agonia… mas vai resistir, tanto é que amanhã completa quatro anos. Parabéns!
Para os desprevenidos, vale alertar que o presente silêncio do sítio distancia largamente da escrita mordente e incessante do autor. Além do que já se sabe, haverá vida, brevemente, numa outra ilha… mais nua.
Tatarana já passou por paragens, revoltas, indecisões e até agonia… mas vai resistir, tanto é que amanhã completa quatro anos. Parabéns!
Para os desprevenidos, vale alertar que o presente silêncio do sítio distancia largamente da escrita mordente e incessante do autor. Além do que já se sabe, haverá vida, brevemente, numa outra ilha… mais nua.
O descanso dos homens
A felicidade está onde a pomos.
É preciso reentrar no paraíso.
Pequena, animosa mata de ulmeiros.
Bolbo vivaz de begónia.
Um abraço. Beijo
que não finda suas dinastias.
O império de só matar a sede.
A sombra que um cego ainda descortina.
imagem: matisse&picasso ... poema: antónio osório
7 de maio de 2007
A incandescência de uma revista de letras
A ideia de que o Movimento Claridoso tenha sido uma espécie de independência cultural da Nação, partilhada hoje pelos maiorais da política cabo-verdiana, parece conter uma espécie de enigma.
Este posicionamento será estrutural ou conjuntural? Haverá unanimidade em relação à essencialidade das premissas Claridosas?
Será que a Cultura Cabo-verdiana, já portadora das matrizes e matizes próprias, muitas delas seculares, teve de esperar vários séculos para dar o seu “Grito de Ipiranga”, apenas nos anos trinta do século vinte?
A diluição da África (?) no paradigma claridoso e o hibridismo político-odeológico da identidade crioula como fenómeno implícito no resgate da claridade são os questionamentos pilares da terceira edição do programa “Claridade Incandescente”. Esta Terça-feira, após a telenovela, com repetição no Domingo.
Claridade: a incandescência de uma Revista de Letras ou de um Movimento Cultural? Jorge Carlos Fonseca, Carlos Reis e Abraão Vicente respondem.
3 de maio de 2007
Sobre a música
Notícias que fazem história (A música de Cabo Verde pela imprensa ao longo do século XX) é o título do mais recente livro da jornalista e investigadora, Gláucia Nogueira, a ser lançado hoje.
A obra resulta de uma compilação de textos publicados em jornais cabo-verdianos, entre 2002 e 2006. Os personagens da música, os avanços tecnológicos, e alguns momentos áureos da música nestas ilhas enformam o trabalho que resulta de uma longa investigação da autora, no âmbito do projecto Dicionário dos Personagens da Música Cabo-verdiana, na forja.
As notas do jornal Noticias de Cabo Verde que dão conta em Julho de 1931 e Junho de 1933 dos lançamentos dos primeiros discos em Cabo-Verde, ou a informação que dá a conhecer o primeiro autor (Jacinto Estrela) de fotografias publicadas num jornal de Cabo Verde são algumas curiosidades que ilustram a importância desse livro.
O fenómeno dos festivais, as relações de Cabo Verde com o Brasil, e o percurso das bandas e de alguns símbolos da nossa música podem, também, ser melhor compreendidos depois da leitura da obra.
Outra nota, vai para a escrita respirável da autora que, com rigor, urde, em perspectiva musical, uma importante parcela da história de Cabo Verde.
O livro será apresentado, às 18:30, no Auditório da Garantia (entidade patrocinadora) pela Historiadora, Zelinda Cohen.
Gláucia Nogueira é brasileira e exerce o jornalismo desde a década de 80, com forte incidência no domínio cultural. Na década de 90, inicia um aturado trabalho de investigação sobre a música cabo-verdiana, nas suas múltiplas vertentes. Paralelamente a isso, a Jornalista é estudante de Antropologia e acaba de integrar a equipa da Universidade de Cabo Verde na qualidade de Assessora para a Imprensa.
A obra resulta de uma compilação de textos publicados em jornais cabo-verdianos, entre 2002 e 2006. Os personagens da música, os avanços tecnológicos, e alguns momentos áureos da música nestas ilhas enformam o trabalho que resulta de uma longa investigação da autora, no âmbito do projecto Dicionário dos Personagens da Música Cabo-verdiana, na forja.
As notas do jornal Noticias de Cabo Verde que dão conta em Julho de 1931 e Junho de 1933 dos lançamentos dos primeiros discos em Cabo-Verde, ou a informação que dá a conhecer o primeiro autor (Jacinto Estrela) de fotografias publicadas num jornal de Cabo Verde são algumas curiosidades que ilustram a importância desse livro.
O fenómeno dos festivais, as relações de Cabo Verde com o Brasil, e o percurso das bandas e de alguns símbolos da nossa música podem, também, ser melhor compreendidos depois da leitura da obra.
Outra nota, vai para a escrita respirável da autora que, com rigor, urde, em perspectiva musical, uma importante parcela da história de Cabo Verde.
O livro será apresentado, às 18:30, no Auditório da Garantia (entidade patrocinadora) pela Historiadora, Zelinda Cohen.
Gláucia Nogueira é brasileira e exerce o jornalismo desde a década de 80, com forte incidência no domínio cultural. Na década de 90, inicia um aturado trabalho de investigação sobre a música cabo-verdiana, nas suas múltiplas vertentes. Paralelamente a isso, a Jornalista é estudante de Antropologia e acaba de integrar a equipa da Universidade de Cabo Verde na qualidade de Assessora para a Imprensa.
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