11 de julho de 2007

(Mal)dita Morabeza


Nunca paramos para pensar no simbolismo da palavra morabeza, o termo que, para muitos, caracteriza o modo de ser dos homens e mulheres destas ilhas. O certo é que sempre fugimos de aprofundar a semântica dessa expressão. Sem esforço suplementar, vê-se (lê-se) no cabo-verdiano morabi (uma expressão muito usada na Brava…será da morabeza?) um ser cordial, manso; um povo hospitaleiro e tudo o mais. Lá isso sempre fomos, se se reparar no modo aberto e doce como lidamos com os Europeus que nos visitam. Sim, porque com os nossos irmãos da Costa Ocidental Africana não somos tão morabis assim!... Numa sondagem, daremos conta que esses homens e mulheres do continente, ao contrário dos turistas do Norte, não nos acham morabis.
Não nos compete aqui avaliar, ou julgar a morabeza cabo-verdiana, mas sim demonstrar a sua inconstância e contextualizar a sua invenção. A duplicidade a que nos referimos comprova, apenas, que essa condição de morabi dos cabo-verdianos é uma construção até certo ponto mítica. Na concepção crítica do sociólogo José Carlos Gomes do Anjos, a "supercordialidade" empregando o termo de Gabriel Mariano (um dos maiores ideólogos da teoria da mestiçagem em Cabo-Verde) tem o seu ápice no Mindelo, considerado pelo sociólogo como o espaço de eleição para "o recrutamento de mediadores para o processo colonial".
Dos Anjos escreve que "a concepção do mestiço como cordial é um dos desdobramentos do mito da "evolução racial", que, opondo às virtudes da africanidade (a emoção) àqueles da europeidade (a intelectualidade), produz uma síntese que tem no porto do Mindelo e na sua pretensa morabeza o seu lugar simbólico e seu emblema – o lugar e o resultado do encontro cordial de raças”.
O discurso de Cabo Verde mestiço teve eco no seio dos intelectuais portugueses, e teve presença efectiva nas suas múltiplas abordagens em relação a Cabo Verde.
Aos 32 anos depois da proclamação da Independência, continuam de pé (e vão surgindo mais) as máquinas de lavagem a reproduzir a tão aclamada morabeza crioula. É por essas e outras que o poeta Kauberdiano Dambará diz que a ilha da Madeira, graças ao autonomismo do tipo João Jardim, é muito mais independente de Portugal do que Cabo Verde. Afirmação controversa, mas que não deixa de demandar alguma reflexão.
Foto origem

4 comentários:

Anónimo disse...
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Anónimo disse...

Olá Margarida
De facto, todos em Cabo Verde falam da Morabeza e eu nunca entendi a verdadeira essência deste coceito.
Este post fez-me lembrar um texto que escrevi, faz algum tempo.Eis o link:


http://sinta10.blogspot.com/2006/03/racismo-ser-o-cabo-verdiano-um-povo.html

pura eu disse...

Benvindo, (estás desaparecido!)

Li o teu texto. Basicamente abordamos a mesma questão. No fundo queremos saber que morabeza é essa...

Um abraço

Margarida

Ema Pires disse...

Passei por aqui, e estive a ler o texto. Quantas saudades tenho de Cabo Verde, amiga foguense.
Um grande abraço