25 de maio de 2007

Histórias tristes (1)

ExampleEm Cabo-Verde fala-se muito na emigração para a América, mas existem poucos relatos pessoais capazes de ilustrar a fractura familiar e social que isso significou para a psique cabo-verdiana.

Pessoalmente, acompanhei, na minha infância, algumas estórias relacionadas a esse drama cabo-verdiano. Muitos familiares dos meus avós e bisavós saíram em vapores para a América e nunca mais voltaram para a sua ilha natal. Talvez por essa razão doa tanto lembrar o desaparecimento do barco Matilde, que, há meio século, partiu da Brava a caminho da América. Oitenta e tal pessoas morreram nessa tragédia. Um monumento que carrega o nome de todos os desaparecidos, na zona de Fajã d`água, na Brava, simboliza esse momento que tanto me intriga a alma.

A minha avó paterna não chegou a conhecer os pais, que embarcaram para a América, no início do século XX, deixando-a bebé na guarda de uma tia. Sempre me chocou o facto da minha avó ter perdido contacto com os pais. Ela dizia que destruía todas as cartas que recebia deles. Era a crença de que viriam mais e mais cartas…Certo dia, pararam as cartas e ela nunca soube dos pais, porque nunca guardara os envelopes que continham os endereços. Anos mais tarde, os seus filhos também foram para a América, mas não chegaram a encontrar os rastos dos avós, que, provavelmente, tiveram outros filhos nas terras do Tio Sam.

Lembro-me, com igual deslumbramento, da minha avó materna a contar, com eternidade no olhar, a saga de duas tias (irmãs da mãe) que, num rompante, chegaram em casa eufóricas e informaram que já tinham se alistado para ir para a América. Pegaram nos seus poucos pertences, puseram-nos num saco e embarcaram. Nunca mais regressaram. Sabe-se que com os anos e o surgir das gerações, mudaram o nosso apelido Andrade para Andrews. Ouvem-se histórias esparsas de um ou outro Andrews crioulo, mas é tudo…

Trarei, numa outra oportunidade, mais histórias tristes, das tantas que ouvi…

2 comentários:

amantedarosa disse...

Fico à espera! Historias como essas merecem ser resgatas. Que bela serie de programas não dariam! Será que pode vir a acontecer?
Gostei muito do programa de ontem.

pura eu disse...

Muito obrigada, Carla! Fico contente que esta primeira história triste, de tantas, tenha tocado alguém. Podem, um dia, quem sabe, ir parar à TV…
Parabéns pelo seu blog!

Margarida