5 de setembro de 2008

Outros Infernos





















O Inferno, tal como é descrito
em certos livros, com gravuras
terríveis, a cores, já ninguém
lhe pega, é gracejos de palhaços
para entreter a malta. Mesmo o amor
que já foi inferno, quando Petrarca
e Dante viam Beatriz e Laura na cama
com outros gajos – se não viam,
então ouviam –, mesmo o amor perdido,
afinal tão perto do paraíso
enquanto se teve a ilusão de que o beijo
é o exorcismo capaz de assustar
o anjo exterminador, mesmo esse
é um inferno excelente para os jornais.
Chateia que se farta, faz chorar
ás vezes e bota-se fora, já não dói.
Há os que acham tesouros a sonhar,
outros vêem-se belos e até príncipes.
São contos de fadas lidos a dormir.
No entanto, há infernos sérios,
pavorosos, como o vento, ciclónicos,
não cabem nos livros, ninguém os pinta.

poema: armério vieira. imagem: pollock a pintar

nota: quando procuro uma ilustração para os poemas de Arménio Vieira a primeira imagem que me vem à mente é a intransigência estética de Pollock: simplesmente, outros infernos.

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