1. Os dois maiores partidos cabo-verdianos estão, há meses, em campanha eleitoral valendo-se, ambos, de todos os meios a seu dispor: tempos de antena, comícios, festivais, inaugurações, programas institucionais na televisão, facebook, autodoors, tudo… Sobre este momento particular do cenário político nacional (os dois partidos se declararam publicamente em campanha), nunca se ouviu uma única palavra (pedagógica que seja) da Comissão Nacional de Eleições.
2. Por esses dias, entretanto, essa mesma comissão está a ministrar uma formação à classe jornalística. A ideia, segundo a presidente da CNE, é ajudar os jornalistas a melhor fazerem o seu trabalho que, segundo diz, não se trata apenas de informar, mas também
orientar as pessoas para o voto consciente. O facto é que os jornalistas já começaram a perder terreno no seu desafio de “orientar”, senhora presidente, simplesmente, porque os cidadãos cabo-verdianos já estão a ser bombardeados por quezílias eleitoralistas, antes da hora, pelos partidos políticos e pelo próprio governo. A dita formação, além do conhecimento das leis, reserva algum capítulo sobre essa questão??!!
3. Num certo parâmetro, é no mínimo caricato termos uma sala de jornalistas a ouvirem de uma jurista qual deve ser o seu papel na cobertura de umas eleições, sabendo todos que os critérios em jogo devem ser estritamente jornalísticos.
4. Mais estranho ainda, é pensar que o grosso desta mesma classe que necessita de “conhecer noções sobre as leis” para fazer o seu trabalho, está classificada em 26º lugar no relatório dos Repórteres Sem Fronteira, no quesito Liberdade de Imprensa, tendo ficado à frente de países como Portugal, Espanha, Itália e outros.
5. O que os jornalistas e
alguns órgãos precisam para fazer o seu trabalho no sentido do voto consciente, como pretende a presidente da CNE, é de ambiente e de espaço: um ambiente que está a ser, a cada dia que passa, sufocado por propaganda e desinformação; um ambiente que não dilua a informação jornalística; um ambiente que propicíe um espaço crítico e
coeso de informação e debate. Um ambiente que diga não à propaganda e a toda e qualquer tentativa de manipulação da informação. Sem esse ambiente, e sem esse espaço, o conhecimento das leis não passa de cansaço e número da CNE.
6. Finalmente, a ONG Repórteres Sem Fronteira terá de rever a sua lista de questionários, porque, pelo desenrolar da situação, estaremos a ocupar, qualquer dia, o 1º lugar na lista dos países mais livres do mundo.