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Procuro uma alegria
uma mala vazia
do final de ano
e eis que tenho na mão
- flor do cotidiano -
é vôo de um pássaro
é uma canção.
poem: Carlos Drummond
Ilust: Pedro Pamplona
“Há males que vêm por bem” é uma expressão corriqueira e muito fechada. Diz muito! O facto é que todos somos resistentes a ela e fugimos incessantemente dos seus tentáculos. Só depois da tempestade, bem depois, é que nos quedamos perante essa máxima. A vida comprova que os bens que vêm depois dos males têm um sabor especial, e é normalmente nessas experiências que paramos para pensar nos instantes, nos silêncios, e nos actos que nos fazem.
Essa máxima sintetiza a dialéctica circular da existência humana, e obriga-nos a reflectir sobre o real significado da palavra fim. Na verdade, reinventamo-nos a cada instante, e criamos o nosso próprio casulo com os erros e acertos que cometemos enquanto seres humanos falíveis, fracos, dependentes, carentes, tristes, e outras vezes fortes, maus, prepotentes, arrogantes e bestas. Há quem consiga o equilíbrio…
Melody
Quero cantar a tua canção/Until the end.
Saber-te
Muitas vezes me surpreendo querendo viver outras vidas. Gosto de me colocar no lugar dos outros... vivenciar em outra pele alguns sentimentos que são meus. Não sei se aquela voz em ti provoca arrepios... nem se gostas daquelas ruas e ladeiras. Não imagino o que sentes ao cruzar com ele na rua.... mas queria saber.
Outra vez...
…a canção.
Freefind
No report semanal do motor de busca, constatei, à exaustão, algumas palavras-chave, o que demonstra que alguém quer muito reler algum texto que escrevi aqui faz tempo. Queria apenas indicar o e-mail acima, e me disponibilizar a ceder todas as informações que aqui publico… O pá, não vou por aí.
AQUI está o pão, o vinho, a mesa, a morada:
o ofício do homem, a mulher e a vida:
a este lugar corria a paz vertiginosa,
por esta luz ardeu a comum queimadura.
poem: Neruda
Jean d´Ormesson , citando Paul Valérie, disse, numa recente entrevista, que o escritor é motivado pela morte, e o jornalista tem na vida o seu motor. Essa afirmação levou-me de imediato aos poemas de Ferreira Gullar. O poeta que reinventa a morte.
Admiro a forma cerebral e natural como ele encara o sopro final à vida. Os poemas de Gullar saboreiam, em concreto, a vida, e cultivam intimidades com a morte. A sua abordagem do espaço, e de instantes é algo de conclusivo. Encanta-me de forma sublime o seu enquadramento da eternidade... nesse particular é emblemático como ele revisita incessantemente a atemporalidade da fotografia, enquanto registo, ou sujeito infinito.
Sente-se ainda nos poemas de Gullar alguma paixão frutal, às podres, inclusive. Amigos morrem/ as ruas morrem/ as casas morrem./ Os homens se amparam em retratos./ Ou no coração dos outros homens./ *
*Trecho do Improviso ordinário sobre a Cidade Maravilhosa (Rio)
Eu deixarei o mundo com fúria.
Não importa o que aparentemente aconteça,
se docemente me retiro.
De fato
nesse momento
estarão de mim se arrebentando
Raízes tão fundas
quanto esses céus brasileiros.
Num alarido de gente e ventania
olhos que amei
rostos amigos tardes e verões vividos
estarão gritando a meus ouvidos
para que eu fique
para que eu fique
Não chorarei.
Não há soluço maior que despedir-se da vida.
Com esse poema final de Ferreira Gullar, Os momentos sela o seu profundo pesar pelas vítimas do acidente aéreo ocorrido, ontem à noite, em S.Paulo, Brasil. Morreram 170 passageiros e outros trabalhadores do prédio da Companhia aérea TAM, em que embateu o avião.
imagem: Sadness, Picasso
Tenho uma disposição particular para momentos e atitudes que emergem de encontros. Nesse bojo entram as artes, nas suas múltiplas manifestações, a cultura, em si como matriz identitária, e outras confluências.
Neste momento, percebe-se que a música de Cabo Verde tem sido a variante mais utilizada para a universalização da "coisa" cabo-verdiana. O disco Das Ilhas Mestiças do bandolinista brasileiro Rodrigo Lessa, é exemplo disso. São treze sons musicados num espírito eminentemente marítimo, porque nos transporta de Cabo Verde, mais precisamente do Calango Mindelo (a primeira faixa do disco) para o Brasil, de onde seguimos viagem para Cuba e Caribe.
No disco, Lessa legitima esse diálogo cultural com motivos históricos que, como sabemos, fazem de nós “seres atlânticos”. Um mundo com suas "afinidades e diferenças".
O disco contou com a participação dos cabo-verdianos Toy Vieira e Vaiss. A brisa caribenha do disco surge do trompetista cubano Júlio Padron. E nunca é demais acrescentar que Das Ilhas Mestiças contou com a participação especial de João Donato, o homem d´a paz.*
...A paz fez o mar da revolução
Invadir meu destino, a paz
Eu pensei em mim
Eu pensei em ti
Eu chorei por nós...
* João Donato escreveu essa canção em parceria com Gilberto Gil e este interpretou-a maravilhosamente.